domingo, 8 de novembro de 2015

Criminal - Capítulo final


Depois de mais de duas semanas, aqui vai o capítulo final de Criminal! (Milagre!)

Desculpas por demorar

Capítulo final


Sonya tinha marcado cabeleireiro nesse dia. Arrumou-se o mais possível, embora soubesse que sensualidade não era o seu ponto forte. Achava-se feia, magra demais, e ainda mais depois de ver as fotos das mulheres com quem o deputado Jett se relacionava, todas estilo melancia.

Por sorte, ela tinha outro ponto forte: uma magnífica capacidade de mentir. Era capaz de envolver qualquer um em sua poderosa lábia, de rir alto e chorar copiosamente sem estar sentindo absolutamente nada. Olhou-se no espelho, dando um último retoque no batom. Pela manhã, conversara com Scott, pela primeira vez em quase cinco anos. Foi uma conversa fria, sem sentimentos fraternos - unidos apenas pelo interesse comum - e eles decidiram que a Viola conseguiria o carro do marido emprestado, para que Sebastian o usasse na noite do assassinato.

Viola era mais que uma mulher melancia. Era gorda mesmo, e tão linda quanto. Tinha um sorriso encantador e, pelo que o irmão lhe garantia, era a pessoa mais inteligente que ele já conhecera. Infelizmente, ela nunca se dedicara a carreira nenhuma, por causa do marido.

Sonya pensou que, quando tudo isso acabasse, e Viola e Scott se casassem, a mulher poderia entrar na empresa da família pela porta da frente, e assumir algum cargo importante. Pessoas inteligentes são difíceis de se encontrar.

Deu um beijo no marido e vários nos pequenos, deixando-os brincando no quarto reservado aos brinquedos. Ela ficava muito mais aliviada quando os garotos estavam acompanhados do pai, em vez das babás. Aprendera com os próprios pais que nada poderia suprir a falta da família.

-Promete que não demora? - O marido pediu.

-Vou fazer o possível.

O restaurante em que foram se encontrar era um caríssimo, no centro da cidade. Ela pensou se o deputado não tinha medo que o flagrassem traindo sua esposa - embora ela não pretendesse nem tocar no nojento.

-Demorou - o pastor tinha um sorriso cínico.

-Foi difícil despistar o meu marido. Eu tenho dois filhos, sabia?

O garçom apareceu, e fizeram os pedidos. Sonya gostava de comer bem - apesar da forma física - mas pediu pouco, para não assustar o cliente. Assim que o empregado sumiu, ela se curvou, para ficar mais próxima do deputado e tirou da bolsa um pequeno frasquinho amarelo, com uma enorme caveira desenhada nele.

-Está vendo isso? - o homem fez um gesto positivo com a cabeça. - É com isso que vou me livrar da sua mulher e do seu indesejável amante.

O pastor deu um sorriso descarado, então perguntou:

-Eles vão sofrer?

-Se vão sofrer? Isto aqui é inalado, mas também penetra pelos poros. Os sintomas iniciais são coriza, sensação de aperto no peito e constrição das pupilas. Depois, vem a dificuldade em respirar, as náuseas e a salivação excessiva. Como a vítima continua a perder o controle de funções corporais, vomita, defeca e urina. Esta fase é seguida por espasmos. Por fim, a vítima entra em coma e sufoca numa série de espasmos convulsivos. O que acaba matando é a broncorréia e o broncoespasmo.

O homem esfregou as mãos, satisfeito. Aquela mulher era mais eficiente do que ele pensara. Ela lhe entregou o frasco, que foi segurado com muito cuidado, e examinado. Não havia nada nele, nem um nome, nem um rótulo, apenas a marca da caveira. Não resistiu perguntar, ao devolvê-lo para a assassina:

-Onde conseguiu isso?

-Não posso entregar minhas fontes.

-Você é maravilhosa!

Sonya sorriu, simulando estar encabulada.

-Seu marido pode esperar mais um pouco enquanto vamos a um lugar mais reservado, não pode?

-Seu safadinho! - tocou com a ponta do dedo no nariz dele, rindo. No fundo, queria cuspir na cara do sujeito e sair correndo. O garçom chegou com os pedidos e os dois comeram, com o deputado tentando ser sensual provocando a sua acompanhante. Ela foi contornando a situação, até finalmente se ver livre do sujeito. Ela só respirou quando se viu em seu carro, rumando para casa. Por precaução, usava graciosas luvas de seda, que ainda tinham a vantagem de enfeitiçar os homens, que as achavam adoráveis. achavam ser sexy.

Ficou ainda um bom tempo flertando com o deputado e garantindo que ele fizesse e agisse exatamente da maneira que queria, já tinha até pensando em uma boa maneira de não tirar o deputado de casa no dia do assassinato do senador, tudo daria certo, estava ansiosa para contar as novidades ao seu caçula.

No meio do trajeto, Sam telefonou. Ela usou o bluetooth do carro para falar com ele:

-Que foi maninho?

-Liga na TV Verdade, liga!

-Não posso. O que tá passando?

Ele aumentou o volume da TV e colocou o aparelho perto. “A Igreja Amor em Cristo está sendo investigada pelo Ministério Público, acusada de tráfico de pessoas. Este homem, que não quis se identificar, afirma que sua irmã foi uma das vítimas.” Em seguida, uma voz mecânica: “Eles disseram pra ela que precisavam de mulheres, que havia crianças desabrigadas e as mulheres eram as mais adequadas pra cuidar delas. Ela ficou com pena e foi, foi e nunca mais voltou.” A reportagem continuava: “Há dois meses, ela conseguiu fazer uma ligação para a família, na qual dizia que estava na Europa trabalhando como prostituta e não recebia um centavo do dinheiro que supostamente ganhava. A nossa equipe  ficou muito tocada e resolveu ajudar, qual não foi a nossa surpresa ao descobrirmos a verdade."

-Como o Seby consegue essas coisas? - Samuel comentava no celular, abaixando o volume da TV.

-Não sei, Sam, mas também não fico atrás, consegui as digitais do corno e ainda o deixei babando por mim.

-O papai estava certo, eu não nasci pros negócios da família, não sou tão minimalista como vocês, já teria dado um tiro nas duas cabeças e pronto.

-Sim, e já estaria preso. - Sonya retrucou do outro lado. - Agora me deixa desligar, vou passar no Seby e deixar o sarin digitado com ele, sabe como é, tenho dois filhos ainda pequenos e sarin não é um bom brinquedo.

-Boa ideia, beijo, Sonya. - desligou o celular.

Sonya rumou para o apartamento do irmão caçula, apesar do horário. Encontrou-o bebendo conhaque e assistindo a um filme qualquer. Deu-lhe um carinhoso beijo na bochecha e perguntou o que ele tinha.

-Nada, não tenho nada.

-É o Edric, não é? - falou baixo e viu que o mais novo hesitava em responder. - Está apaixonado por ele, não está? Sebastian Sobakin, eu troquei suas fraldas, não minta para mim!

Seby viu que não adiantava mais esconder. Deitou a cabeça no colo da irmã e chorou até não poder mais.

-Shhh, chora, chora - dizia ela e acarinhava-lhe os cabelos, pacientemente deixando que ele desabafasse. Enquanto os minutos foram passando e o seu irmão não foi se acalmando, começou a se preocupar. Era uma péssima ideia apaixonar-se por um garoto complicado como Edric. Seby só iria sofrer. - Seby, fala comigo, sou sua irmã.

-Estou cansado. - não levantou a cabeça do colo da irmã, mas tentou acabar com as lágrimas.

-Não, pode chorar. Eu entendo que você esteja sofrendo.

-Entende?

-Essa sua situação é muito delicada. Edric não deve ser o amante mais apaixonado desse mundo - e riu.

-É, você não tem ideia, não sabe como eu estou me sentindo.

-Claro que não sei! Mas eu estava brincando - beijou a testa dele. - Por que não manda ele lá pra casa, para ficar longe dele?

Sebastian deu um pulo de sua posição confortável e disse, impulsivo:

-Não!

Sonya sorriu. Sabia como era estar apaixonado e também sabia que a o caçula não sabia como era e deveria estar bem confuso.

-Então, meu amor, assuma para ele, quando tudo isso acabar, quem sabe ele não é o amor da sua vida? - falou rindo, pois sabia que seu irmão não acreditava em amor.

Sebastian baixou a cabeça, pensativo. Por um lado, a ideia o tentava. Mas havia o problema das próprias emoções do jovem Brooke.

-Ele foi violentado pelo padrasto. Ele me tem como um porto seguro e isso seria traí-lo.

-É, realmente tem um problema, Seby - após pronunciar isso, sentiu que tinha falado besteira. Procurou consertá-lo: - Nós vamos contornar isso, maninho. Eu sei que você vai saber contornar e eu vou te ajudar.

-Vamos? - repetiu mecanicamente.

-Lógico que vamos, você é meu irmão pentelho que me dá um trabalhão. - bagunçou o cabelo do irmão.

Sebastian ficou todo pensativo com o comentário da irmã e começou a se recompor. Sonya acreditou que seu comentário havia feito bem ao irmão e sorriu.

-Agora o verdadeiro motivo de eu ter vindo - entregou uma pequena maleta. - Sarin com as digitais do deputado. Mas cuidado, só manipula com luvas - e sacudiu as suas queridinhas. Ela tinha uma enorme coleção de luvas, para combinar com qualquer vestido que resolvesse usar.

O rapaz recebeu com um já refeito sorriso. Poria o plano em prática assim que Katlyn e Alicia deixassem o senador sozinho em casa.

-Bom te ver mais animadinho.

-Esses crápulas terão o castigo que merecem - finalizou Seby, sorrindo.

-Maninho, eu infelizmente tenho que ir embora, sabe como é, vida dupla… Fica bem. - beijou novamente a testa de seu irmão.

O rapaz guardou a maleta com o veneno no cofre e foi deitar, precisava colocar os pensamentos em ordem, nunca foi ou esteve confuso na vida, deveria se situar, ou colocaria todo o plano a perder.

Passou pelo quarto de Edric, que estava com a porta aberta, notou que o menor já estava dormindo - e, para ajudar, de cuecas de novo -, recriminou-se mais uma vez, não deveria estar sentindo o desejo pulsante que sentia, deveria controlar-se.

Já no seu quarto, atirou-se na cama, vestido como estava. Respirou fundo várias vezes, procurando relaxar. Seu corpo estava tenso e não obedecia. Decidiu ler um pouco, para se distrair. Pegou seu livro favorito, folheou, folheou, mas não conseguia se concentrar.


No dia seguinte, quando estava tomando seu desjejum, Sebastian recebeu uma ligação. Era Katlyn:

-Queria te agradecer.

-Não foi nada, tudo bem.

-Não, você não tem noção de como me ajudou. Vou pra Suíça com a minha mãe agora, dia 18.

-Que bom, fico feliz, por vocês, realmente.

-Não vamos nos ver tão cedo mais, então, de verdade, obrigada. - sorriu do outro lado da linha e desligou o telefone.

Dia dezoito. Mais cedo ainda mas, por sorte, a notícia do tráfico humano já fora veiculada na TV, o deputado já tinha declarado guerra ao senador em todos os jornais, era o assunto do momento. Além disso o senador confiava em Sebastian, tudo estava andando conforme o planejado.

Edric apareceu e sentou-se a mesa um tanto receoso, estava confuso com seus desejos, não queria, em hipótese alguma, machucar o seu benfeitor.

-Bom dia, Sebastian.

-Bom dia, Edric! - havia se convencido, no dia anterior, de que não sucumbiria ao desejo. Edric seria protegido, custasse o que custasse.

-Estou ansioso, hoje eu vou na Rachel.

-Verdade, havia esquecido. Que bom que está ansioso.

-E nervoso. Espero não ter uma crise histérica lá.

-Fica tranquilo, a Rachel é uma ótima psicóloga.

-Eu acredito em você, vai ficar comigo durante a sessão, não é?

-Se é isso que você quer… - sentiu o peso daquelas palavras, Edric confiava nele.

No dia 19, um dia após a viagem das duas mulheres, Sebastian foi à casa do senador Irvin Brooke, que se encontrava em casa. Havia dispensado os empregados e encontrava-se sozinho em casa, bebericando um uísque caríssimo. Pensava em como se aproximaria da pequena filha da cozinheira Yolanda.

-Sebastian, que surpresa boa. - abriu a porta e o convidou a entrar. - Estava pensando como conseguiria arrumar um adversário para uma partida de xadrez Aceita?, dispensei os empregados e estou sozinho em casa, para ajudar estou sem telefone, essas companhias são horríveis.

-Imagino - respondeu frio, adentrando a mansão. “Esqueceu-se” de contar que a razão pela qual ele estava sem telefone não se devia à incompetência das companhias telefônicas, e sim às mãos graciosas de Sonya, que habilmente cortara os fios.

Já dentro da casa, caminhou tranquilamente atrás do senador que falava sem parar, mexeu na seringa com o calmante que jazia em seu bolso e no primeiro descuido do senador, aplicou a injeção em sua nuca de uma só vez.

-Mas o que… - começou a sentir-se tonto, sua voz tornou-se pastosa, sua língua mole, os membros pesados e não conseguiu mais segurar o próprio peso, desabando no chão como uma mala velha. Apesar disso, estava consciente e viu Sebatian o carregar até o quarto secreto, e o algemar na cama, braços, pernas. Não estava entendo o que seria aquilo. Por um segundo cogitou que Seby tinha uma espécie de geatriofilia, mas logo descartou. As fotos na parede adquiriam uma coloração sinistra, da posição em que estava.

O Sobakin sentou-se na poltrona próxima e ficou ali em silêncio somente observando o efeito da droga ir passando e o senador começar a se debater. Em poucos minutos, ele já conseguia falar:

-O que você está fazendo?

-Esperando o efeito da droga que apliquei passar, assim poderei ter o prazer de vê-lo sofrer.

O senador apavorou-se tirando assim um sorriso do rosto de Sebastian que se deliciava com a situação. Impossível. Não, era impossível que alguém fosse fazer uma crueldade desse tamanho com um homem como ele. O velho tentou rir:

-Isso é uma espécie de brincadeira? - perguntou.

O assassino quase gargalhou nesse momento:

-Daqui a pouco você vai ver quão séria é essa “brincadeira”...

Desesperado, o velho se mijou nas calças e começou a suplicar pela própria vida:

-Não pode fazer isso comigo. Sou um defensor da paz, da justiça, da igualdade. Como pode tirar a vida de um homem como eu, empenhado em proteger o país?

Seby riu pelo nariz:


-Belo exemplo de homem público você é, mijando nas calças ao primeiro sinal de perigo. Além do mais, veja todas essas fotos aqui, de duas crianças que são suas filhas!

-Eu jamais faria isso, Sebastian pelo amor de deus, você me conhece.

-Você foi rápido, minhas vitimas demoram mais tempo para começar a suplicar normalmente. E outra, não seja mentiroso, sei muito bem do pedófilo que você é, seu porco imundo.

-Sebastian, mentiram pra você, não, acredite em mim, somos iguais.

-NÃO! Não somos iguais.

Ao ver que sua argumentação não funcionava, o senador mudou de tática:

-Quanto você quer? Diga, todos têm um preço.

-Sim, e eu já fui comprado. Infelizmente a ideia de privar o mundo de uma ameba como você não foi minha, sua cabeça está a prêmio, senador.

-Pois eu pago o dobro! - gritou, desesperado.

-Não, até porque de todos os trabalhos que já fiz, esse será de longe o mais prazeroso.

-Pago o triplo!

Sebastian sorriu sarcasticamente. Primeiro, porque sabia que o velho estava quebrado, nunca teria tanto dinheiro assim. Depois, porque jamais se venderia depois com a situação naquele pé não existia mais volta.

-Sabe, pensei muito na melhor maneira de liquidar com sua vida, afinal você merece sofrer, por tudo que fez as pessoas que se aproximaram de você.

-Sebastian, eu lhe considero um filho, temos tanto em comum. - tentava apelar para o emocional do rapaz.

-Por isso pensei em um veneno, não sei se conhece, Sarin. - ignorou completamente o senador e retirou o veneno do bolso.

-Eu o aceitei na minha família, lhe entreguei meu filho, minha filha, abri as portas da minha casa para você, não é possível que isso não mereça um pingo de consideração, Sebastian.

-Merece, merece a pior morte pelo que fez a uma criança tão pura do Edric, a uma menina tão cheia de vida como Katlyn. - mostrou o vidrinho com o veneno. - Esse veneno é poderoso. - levantou-se e colocou o vidro no abdômem do homem que gelou. - Ele é um gás, e, uma vez que esse vidro quebrar, o gás será liberado, você inalará e começará a sentir-se mal.

O velho começou a choramingar e implorar.

-Os sintomas iniciais serão a coriza, a sensação de aperto no peito e a constrição das pupilas. Depois, vem a dificuldade em respirar, as náuseas e a salivação excessiva. Eu adoro essa parte: logo depois você vai perder o controle de funções corporais, vomitar, defecar e urinar (se bem que isso você já fez) - e riu. - A fase final, é a minha favorita: você entrará em coma e sufocará numa série de espasmos convulsivos, até finalmente morrer.

-Não, pelo amor de Deus, não!

-Se eu fosse você não me mexeria tanto, afinal se ele cair, vai morrer mais rápido não?

Irvin prendeu a respiração. Não respire, não respire, senão o vidro vai cair. Sebastian gargalhou alto da reação do senador, que não conseguiu prender a respiração por muito tempo - e logo o frasquinho caiu. Mas, para sua surpresa, nada aconteceu. Ele não era de vidro.

-Nossa, como você é burro, senador, achou mesmo que eu colocaria o verdeiro frasco sem me precaver antes. - retirou o verdeiro frasco de dentro de seu bolso e uma máscara junto.

Ao ver que todas as suas tentativas falharam, o Brooke começou a gritar bem alto por socorro. Não era possível que ninguém ouvisse.

-Não grite, senador, nos poupe do vexame, ninguém o ouvirá mesmo.

-Isso é o que você pensa! Há um caseiro lá atrás, ele vai ouvir e vai vir o que é - era um blefe, afinal tinha dispensado todos os empregados para ficar sozinho com Katlyn (o que não aconteceu, claro, pois a menina já estava na Suíça) e não conseguira haver meio de os fazer desistir da folga.

-Então terei que adiantar meus planos, queria vê-lo sofrer um pouco mais. - começou a se arrumar, fechou sua jaqueta de couro até o alto da garganta, colocou sua mascara, levantou a luva, colocou o capuz.

-Não faça isso, Sebastian! Não é possível que alguém como você, que comprou o Edric, fique tão revoltado com as minhas idiossincrasias sexuais.

Comprou o Edric. Não por isso, porque naquela hora fora simplesmente comercial. Mas agora, em que ele estava loucamente apaixonado pelo garoto, isso havia mudado. Ficou tão distraído em pensamentos que não regulou a máscara corretamente, só conseguia pensar em Edric, tentava convencer-se que nunca faria mal a ele, que sempre controlaria seus impulsos, mas já começava a duvidar de si mesmo. Enquanto isso, o senador implorava, berrava, chorava, desesperado.

Voltou a si e travou a máscara, pegando o vidro com o veneno em seguida. Rompeu o lacre - nunca havia pensado porque esses produtos de contrabando tinham lacres - e viu o gás encher o quarto.

-Por mais que eu queira vê-lo sucumbir, não posso dar-me a esse luxo. Você deve me entender, não é? Vou me retirar, mas espero encarecidamente que você sofra bastante. - disse saindo do quarto em seguida, deixando o senador sozinho com seu desespero.

Desceu as escadas e saiu da mansão assim como entrou, sem ser visto. Retirou as roupas que usava com todo o cuidado do mundo, assim como a máscara e ateou fogo, para não deixar nenhum vestígio, entrou em seu carro e começou a dirigir de volta para casa, com a sensação de dever cumprido.


No meio do caminho, estava passando por uma autoestrada, quando começou a sentir um aperto forte no peito. Tentou controlar com a respiração, mas parecia impossível. Pensou se havia inalado sarin por engano. A visão começou a ficar turva e a saliva vir em excesso. Sim, havia inalado o veneno. Tentou encostar o carro para ligar para Sonya e pedir socorro, mas não acertou o pedal do freio. Pisou, sem querer, no acelerador, e viu o carro sair pela tangente numa curva, batendo no guard rail e capotando fora da estrada. Os airbags foram acionados, e, graças a isso, Seby caiu sobre os airbags, o carro caiu a 30 metros da estrada. Inconsciente, não pôde chamar ninguém para ajudá-lo.


Ainda nos arredores da casa do senador, Sonya consultou o relógio. Duas da manhã. Já dera tempo de fazer o serviço. Resolveu ligar pro irmão, o telefone tocou, tocou e nada. Tinha alguma coisa errada, Sebastian nunca deixara de atender, não importava a hora. Resolveu passar na casa do senador, pela última vez. O carro dele não estava mais lá. Mentalmente, imaginou que caminho ele poderia ter tomado para casa. Pela autoestrada, claro, ele era tão apressado. Foi fazendo o caminho a casa de seu irmão pela autoestrada da maneira mais lenta que conseguia, observava tudo à procura do irmão. Perto da curva mais perigosa do local, divisou, fora da estrada, uma massa disforme de metal. Seu coração falhou uma batida. Não, não é, repetia para si. Mas parou no acostamento, só para ter certeza. O carro era preto, a cor coincidia. Desceu a pequena elevação. Conseguiu, na semi escuridão, iluminada apenas pelos faróis do seu Mercedes, divisar a placa. Era a mesma.

-Seby! - gritou, aterrorizada. - Seby, por Deus, responde!

Chegou perto do carro. Agachou-se pra olhar pra dentro, onde viu o irmão inconsciente, deitado sobre o airbag. Por sorte, ele usava cinto de segurança.

Rapidamente, ela pegou o telefone. Ligou para o dr. Modesto Marino, seu tio, médico de confiança da família, explicando a situação. Ele logo mandou uma ambulância e os paramédicos para dar os primeiros socorros.

Sonya tinha que devolver o carro para Viola, que conseguira o carro do marido emprestado, então não pôde ir com o irmão. Ligou para a sua mãe, contando a situação. Ela logo correu pra atender ao caçulinha.

-Pelo amor de Deus, Modesto, como vai Seby? - Fiorenza apertava as mãos.

Modesto tinha cerca de sessenta anos, cabelos grisalhos apenas nos lados da cabeça, era alto e um tanto atarrancado. Não lembrava em nada a irmã.

-Nada bem, Fiorenza, o acidente foi feio. - respirava fundo, tomando cuidado com as palavras. - Nós já aplicamos o antídoto contra o sarin, mas ainda não foi possível ver se fez efeito.

-Sarin?! O que ele estava fazendo com um veneno tão perigoso?! - a pobre mulher estava apavorada

-Não sei, mas faremos de tudo para ajudar, mas ainda é cedo para qualquer resposta.

Sonya, por sua vez, nunca dirigiu tão rápido em sua vida, chegou ao ponto de encontro, perto da casa do deputado o mais rápido que conseguiu. Estacionou de qualquer jeito, jogou as chaves do seu irmão e a amante, tremendo.

-Sonya o que aconteceu? -  Scott entregou as chaves à amante e mandou ela se retirar.

-O Seby… o Seby… -  a irmã andava de um lado para o outro sem reação.

-O que aconteceu com o Sebastian? - o homem aproximou-se tentado passar confiança para a irmã que em primeiro momento não aceitou sua presença.

-Ele sofreu um acidente, capotou o carro e tudo. O tio Modesto já está cuidando dele e eu acho… - parou um minuto, chocada - acho que ele inalou sarin por acidente. Scott, o Seby não. - aceitou o abraço do irmão e aconchegou-se em seu peito.

-O que vocês tinham que fazer? Justo sarin?!

-A culpa foi toda minha! Eu tive essa ideia!

-Não, a culpa não é sua. - não soltou a irmã de seus braços.

-É claro que é! Se eu tivesse ficado quieta, o Seby tinha dado um tiro no véio e estaria tudo bem - começou a chorar. - Oh, Scott, o que vai ser agora?

Viola observava tudo de longe, imaginando qual o problema. Sem dúvida, era algo muito grave. Gostaria muito que lhe explicassem por que o carro do Robert era tão importante. Mas, achou que aquele não era o melhor momento para perguntar, se Scott havia pedido para sair, ele sabia o que estava fazendo. Entrou no carro e saiu.

-Vamos vê-lo? - convidou a irmã. - A mãe está com ele no hospital.

-Vamos, mas eu dirijo, você não está em condições.

Sonya não fez objeção. Ao chegarem ao hospital, encontraram a mãe numa sala de espera confortável. Ela torcia as mãos, preocupada. Ao ver o Scott, seu coração disparou. O filho pródigo ao lar retorna, pensou, antes de dar-lhe um gostoso abraço.

-Scott, querido, sabia que voltaria pra sua família!

-Mãe, como está o Seby?

-O Modesto falou que o estado dele é muito grave - explicou mrs. Sobakin. - Já deram o antídoto pro sarin - aliás, preciso saber onde ele conseguiu uma arma tão poderosa - e ele fraturou duas costelas, a perna em três lugares, teve uma concussão cerebral, duas paradas respiratórias, mas o mais preocupante é que uma das costelas perfurou o pulmão, e com o agravante do veneno, a respiração está muito comprometida. E, vocês sabem, falta de ar afeta o cérebro. Eu não sei o que farei se perder meu filhinho.

-Mãe! O tio Modesto está cuidando de tudo. Ele sabe o que faz. O pai já sabe o que aconteceu? - Sonya perguntou.

-Não, ele toma remédio pra dormir e só acorda na hora. Saberá só amanhã de manhã, mas deixei um bilhete para ele dizendo onde estou, caso ele acorde de madrugada e me procure. - segurava a cabeça desolada.

Scott abraçou novamente a mãe. Queria dizer que estava ali, para o que desse e viesse, mas não conseguia achar uma palavra de conforto para a querida mãezinha.

-Oh, Scott, é até um pecado, mas estou tão feliz que esteja conosco.

Sonya concordou com a cabeça.

-Temos que avisar o Sam, ele saberá lidar com o papai amanhã de manhã melhor que nós.


-Liga você, eu vou ver se alguém me dá alguma notícia. - entregou o celular ao irmão e sumiu portas a dentro do hospital. O promotor ficou olhando para o aparelho, indeciso. Além do pai, a briga mais feia fora com o Sam. Hesitava em ligar e causar outra peleja. Olhou pra mãe, que estava muito abalada. Ela não estava em condições de falar com ninguém. Tomou coragem e ligou.

-Fala, Sonya. Não, você não interrompeu nada, se era a sua intenção.

-Não é a Sonya, sou eu, o Scott.

-O que você quer?

-O Seby sofreu um acidente e estamos no hospital…

-Não é problema meu, Scott, bom resto de noite. - desligou o telefone.

Scott conhecia o irmão e sabia que ele não havia prestado atenção em uma palavra que ouvira, por isso ficou olhando para o visor do telefone esperando que o mais velho retornasse. Passaram-se exatamente 37 segundos até que o aparelho começasse a vibrar novamente.

-Alô?

-Scott, o que você disse mesmo? Não entendi direito.

-O Seby sofreu um acidente, assunto delicado para explicar por telefone, o estado é grave. - respirou para continuar,

-O Seby, acidente? Acidente de quê?

-De trânsito - agora lembrava-se o que mais o irritava no Sam. Ele era absurdamente lerdo. - Sam, vem para o hospital, aqui eu explico.

-Tá ok. Cês tão no hospital do tio Modesto, né?

Surpreendeu-se. O Sam que conhecia não era capaz de deduzir algo assim. Mas acabou por responder:

-Sim, vem rápido. - desligou o telefone a tempo de ir até Sonya que esbravejava.

-Isso é um absurdo!

-Sonya, isso aqui é um hospital, fale baixo!

-Não me deixaram ver o Seby, disseram que só quando a cirurgia acabar, eu quero ver o meu irmão. -

-Sonya, por favor. É claro que você não pode vê-lo durante a cirurgia. Fica calma.

-Scott, diz que vai ficar tudo bem. - abraçou o irmão se entregando às lágrimas.

-Calma, é o Seby, ele vai ficar bem, ele vai ficar. - tinha que controlar-se. A irmã era tão impulsiva quanto os pais. Às vezes pensava que ele e Seby eram adotados, para serem tão mais calculados.

Sam não demorou a chegar, acompanhado de uma belíssima mulher careca. Ela trouxera uma garrafa térmica com chá para todos.

-Cadê o Seby? - nem percebeu a presença de sua mãe, foi direto falar com o Scott e a Sonya.

-Ele está em cirurgia, ninguém pode vê-lo (né, Sonya?), mas o estado é grave.

-Como que ele foi bater o carro? Ele sempre dirige com tanto cuidado!

-Ele inalou o sarin. - Sonya se culpava.

-O QUÊ?! Eu avisei que ia dar merda, eu avisei, mas alguém me escuta? Nããão… “O Sam é burro, não dá trela pra ele”. Eu avisei.

-Samuel, agora não é hora, quando ele estiver bem, no quarto, você briga, agora não. - falou apontando para Sonya que ficou pior que estava.

-Isso se ele sobreviver. Aquilo é uma arma química, Scott.

-Samuel!

-E diz que não é verdade!

Rachel se aproximou do noivo, tocando suavemente seu braço. Foi suavemente também que ela disse:


-Todos sabemos disso, Sam. Mas não vai ajudar agora. Toma esse chá, vai te deixar melhor.

Estavam juntos ali, tomando o chá que Rachel trouxera, quando o Doutor Modesto apareceu.


-E Então? - Fiorenza cercou o médico.


-O Sebastian respondeu bem à cirurgia, mas ainda está entubado. Agora, precisamos dar tempo ao tempo. Os aparelhos cuidarão dele. Mas, tem algo que ainda me preocupa.


-O que é, tio? - Scott conseguiu se pronunciar.


-Ele não está respondendo bem ao antídoto do Sarin, iremos esperar doze horas, se ele não responder, iremos induzi-lo ao estado de coma.


-Não, meu bebê não. - Fiorenza foi amparada pelos braços do seu filho mais velho.

O médico tocou o ombro da irmã. Era doloroso demais pra ele dar essas notícias, ainda mais se tratando do seu sobrinho querido.


-Estamos fazendo todo o possível, Fiorenza. Este é o melhor hospital do país. Fique tranquila, ou tente pelo menos.

Ela enxugou as lágrimas grosseiramente. Em seguida, levantou os olhos para o irmão, confirmando com a cabeça. Depois, perguntou:


-Podemos vê-lo?


-Ele está no centro de recuperação. Não acho prudente, por enquanto. Vão para casa descansar um pouco e amanhã poderão vê-lo.


-Não vou conseguir descansar sabendo que meu pequeno está nesse estado! - desabafou a mulher, sufocando mais lágrimas.


-Quer que eu receite um calmante, minha querida?


-Não, quero que você cuide do meu bebê, só isso.


-Eu estou fazendo isso, Fiorenza. Vá para casa, descanse. - Pegou um bloco do bolso, onde fez alguns rabiscos. Entregou uma folha para Sam. - Compre esse remédio para ela, lhe fará bem. Amanhã, venham ver Sebastian. Eu nunca faço isso, mas ficarei aqui a noite toda e, se houver alguma alteração no estado dele, ligarei imediatamente.


-Não, eu vou ficar aqui com meu bebê.


-Mãe, vai com o Sam, descanse e converse com o pai quando ele acordar, eu ficarei aqui, juro para senhora que não sairei daqui um único minuto. - Scott falou passando um pouco de tranquilidade para mãe, que aceitou ser guiada pelo Samuel.


-Tá bom, meu anjo - beijou-lhe afetuosamente a bochecha. - Vai ficar também, Sonya?


-Acho que não, preciso ir pra casa ver meus filhos.


-Vai lá Sonya, eu fico aqui. - Scott beijou a testa da irmã.


-É rápido,Scott, vou só tomar um banho e avisar minhas família, eu volto rápido.


-Dorme até amanhã, Sonya. Eu ligo se algo mudar.

Todos se retiraram e Scott jogou-se no sofá da sala de espera, desolado. Culpava-se, em parte, pelo acontecido, afinal, Seby se envolvera naquilo para ajudá-lo. Pensou em ligar para Viola e contar o que acontecera. Depois desistiu, só iria preocupá-la à toa (se é que ela já não estava preocupada).

Acabou cochilando no sofá. Acordou várias vezes, sobressaltado. Nada de novo.


O velho Sobakin acordou no horário habitual, naquela manhã. Encontrou o bilhete da esposa e não perdeu tempo: foi correndo para o hospital do seu cunhado, onde sabia que ele estaria. Modesto teria que lhe dar notícias do filho. No hospital, porém, encontrou o outro filho. O Scott estava sentado em uma das salas de espera perto do CTI, cochilando de qualquer maneira em uma poltrona desconfortável.

No primeiro momento, não acreditou no que via. Scott, aquele ingrato, velando pelo irmão caçula? Impossível. Ele devia estar ali por algum outro motivo, talvez algum de seus novos amigos. Depois concluiu que seria coincidência demais.

Igor não ia conversar com o filho, até Modesto aparecer e ir na direção de Scott. Disse alguma coisa que o empresário não pôde ouvir. Então, este tomou a iniciativa de ir até o cunhado e dizer que não precisava dar informações sobre Sebastian para aquele ingrato.

-Essas informações só interessam à família.

O cunhado surpreendeu-se com a presença do velho Sobakin ali. O filho pródigo ergueu-se do seu lugar. Ambos não digeriram direito o que fora dito.

-Olá pai, senta. - seu tio havia acabado de lhe falar que seu irmão havia piorado, e para ajudar pediu-lhe que desse o recado à família, pois tinha uma cirurgia para realizar naquele momento.

-O que está fazendo aqui, Scott? - insistiu Igor.

-Pai, senta aqui. - insistia pro pai se tranquilizar.

Modesto pediu licença e retirou-se. Como presidente do hospital, não era comum que fizesse cirurgias, mas não pudera recusar aquela.

-Como está o Sebastian? O que o Modesto te disse?

-Ele piorou, o tio induziu ao coma, pois o pulmão dele já estava entrando em colapso. - Scott abaixou a cabeça.

-Como ele foi ficar desse jeito? O que você fez com ele?

Scott assustou-se com o comentário do pai, ele nunca fez mal a ninguém, muito menos a seu irmão, não era esse o motivo de ter se desligado da família. Pelo contrário. Mas a culpa por ser um dos beneficiados pela morte do senador aflorou.

-Vocês brigaram? - insistia o velho.

-Claro que não, ele foi encerrar o caso do senador com o veneno sarin, e, pelo o que eu entendi, ele inalou um pouco...

-Sarin?! O que deu pra ele usar sarin? Eu mesmo nunca usei sarin em nenhum dos meus casos! Por que disse a ele para usar esse veneno, o que passou na sua cabeça?

-Pai, pelo amor de Deus! Eu fui contra eliminar o senador. Eu queria notificar o Ministério Público contra os crimes do homem! Seby que insistiu em levar o plano até o fim! E eu nem sabia o que era sarin, até esta noite!

O velho abaixou a cabeça. É verdade, Scott era contra os negócios da família. Achava que tudo tinha que ser feito dentro da lei, e jamais pensaria em usar um produto proibido.

-Como você soube de tudo isso, então?

-Encontrei com a Sonya de madrugada e vim ao hospital com ela.

-Com a Sonya? Você fez as pazes com a família e eu sou o último a saber?

-Pai, eu nunca briguei com vocês, vocês que me excluíram de suas vidas. Eu nunca deixei de falar com o Seby. - quase não segurou as lágrimas.

O velho Sobakin comoveu-se com a atitude do filho. Ele o amava, e muito, e não conseguia entender como ele poderia negar o principal trabalho da família.

-Scott, meu filho. A culpa é minha. Você saiu da minha casa batendo a porta, dizendo que nos odiava. Eu fiquei furioso, e proibi sua mãe e seus irmãos de vê-lo. Mas Sebastian me desobedeceu, como sempre.

-Você e o Sam disseram que eu tinha sangue de barata. Eu tinha todos os motivos de ficar irritado

-Eu sei disso, meu filho. Todos nos exaltamos demais - deu uns tapinhas nas costas dele. - Agora vai voltar para casa, e assumir seu lugar de direito na empresa? Nosso advogado é um banana, sentimos muito a sua falta.

-Pai, você sabe que não, sou um promotor do estado e me orgulho disso.

-Também me orgulho do que conquistou sozinho.

-Mas, sempre que precisaram de mim, sabem onde me encontrar.

-Na verdade, não sei. Onde você está? Casou? Filhos?

-Não, nunca casaria sem convidá-los, vocês são minha família, por mais que não gostem disso. Mas, estou namorando uma mulher incrível.

-Mas isso é maravilhoso, filho! Quem é ela?

-A esposa do deputado Robert Jett.

-Esse é o meu garoto! - exclamou Igor, falando alto demais sem querer. Depois, mais baixo: - Soube que saíram umas denúncias feias contra o deputado. Diga para a moça se separar logo e casar de uma vez com você. Estou louco para ter mais netos.

-Acho que os do Sam chegam antes dos meus, ele e a Rachel estão bem sérios.

-Ih, filho, isso é só agora. Daqui a pouco eles brigam de novo. Aquela moça é complicada…

-Eu achando que ia encontrar a terceira guerra mundial instalada e vocês conversando normalmente. - Sonya chegou falando alto como era de sua natureza.

-Filha - mr. Sobakin se ergueu e segurou as duas mãos dela -, como que o Sebastian foi conseguir sarin? Isso pode matá-lo!

Ela sorriu amarelo. Mas mudou de assunto:

-Scott, vai tomar um café, eu fico aqui com o pai. Alguma novidade no estado do Seby?

-Ele está em coma induzido.

-Oh, meu Deus. Não deu as doze horas ainda.

-O Pulmão dele estava entrando em colapso.


Rachel e Sam levaram Fiorenza para a casa deste. A psicóloga usou seus conhecimentos zen para fazer um relaxamento na sogra, que acabou se acalmando e concordando em tomar os remédios. Dormiu logo. O casal, exausto, também voltou para a cama. Pelas 11 manhã, Rachel foi ver Edric. Alguém precisava contar pra ele o que houvera e seu noivo ia conversar com o pai.

-Oi, Edric, querido.

-Rachel? Eu fiz algo de errado no EMDR?

-Não, querido…

-Ah, o Sebastian não está, fui acordá-lo, mas ele já havia saído, entra.

-Eu sei, Edric.

-Como? - o jovem Brooke não entendeu.

-Eu sei que Sebastian não está.

-Também sei onde ele está, e é por isso que vim falar com você.

O jovem ainda não entendia. Sentou-se no sofá e fez sinal para ela se sentar também.

-Você sabe que Sebastian foi eliminar seu padrasto ontem à noite, não sabe? - o rapaz confirmou com a cabeça.

-Você sabe onde ele está? Ele foi preso? - havia visto a manchete do jornal, sobre a morte do senador.

-Sabe qual foi o método que ele usou? - gesto negativo. - Um veneno poderoso. Infelizmente, ele inalou um pouco do veneno.

-Não… Não pode ser…

-Você precisa ser forte e se tranquilizar.

-Onde ele está?

-No hospital.

-Eu quero vê-lo.

-Infelizmente não será possível, ele está no CTI e não pode receber visitas.

Ela se debruçou sobre a mesinha de centro e tocou o ombro do rapaz:

-Sei que está sofrendo, mas todos estamos.

-O Sebastian é tudo que eu tenho, ele não pode morrer. - falava com o choro embargado.

-Ele não vai. Está sob os cuidados do melhor hospital do país, que pertence ao tio dele.

-Quero ir pra lá.

-Não vai resolver muito, ele não pode receber visitas. Mas eu prometo que, assim que ele puder receber visita, eu avisarei você.

-Eu quero ir pro hospital!

-Edric, entenda que não há nada que você possa fazer lá…

-Eu não ligo, quero ir pro hospital!

Ela respirou fundo. Como dissuadi-lo? Acabou por ceder, afinal:

-Tudo bem, mas, por favor, tente controlar-se. Vamos lá.

Edric se controlou para não surtar no caminho, mas, ao chegar no hospital, foram recebidos pelo dr. Modesto, que explicou que Sebastian piorara. Por isso, teve que ser induzido ao coma, para proteger seus órgãos vitais que já estavam entrando em colapso.


Onde ele está? - perguntou tremendo.

Modesto ergueu uma sobrancelha:

-Quem é ele? - perguntou à Rachel, que não soube como responder. Acabou dizendo:

-É da família, pode deixá-lo ver Sebastian?

O médico pareceu não acreditar, e continuou:

-Já o conduzimos ao CTI. A família já o visitou… - foi interrompido por Sonya.

-Edric, querido. - abraçou o menor. - Tio, o Edric é muito importante pro Seby, vou levá-lo para ver meu irmão, tudo bem? - não esperou respostas, saiu abraçada com o menino.

O tio deu de ombros. Não estava gostando daquele auê no CTI, mas não interferiu.

Edric foi o caminho todo tentando manter-se calmo, mas ao chegar a porta do leito de Sebatian e vê-lo toda machucado, entubado, desacordado, não resistiu mais e caiu em um choro silencioso, mas comovente. Adentrou o local e sentou ao lado do leito, não reparou os olhares curiosos que a família Sobakin lançava para ele, somente pegou a mão de Sebastian e a apertou.

-Não me deixa, Sebastian. Eu te amo tanto. - beijou a mão do Sobakin que não reagia. - Por favor, você é tudo pra mim, fica comigo.

A família Sobakin assistia à cena sem se surpreender. Alguns deles, como a Sonya, já torciam para que aquilo acontecesse. Passaram-se uns cinco minutos sem que Edric se movesse, quando uma enfermeira tocou-lhe delicadamente o ombro:

-Precisa sair, as visitas no CTI não podem ser muito longas.

-Deixa eu ficar só mais um pouquinho.

-Infelizmente são as regras do hospital. Fora que está incomodando os outros pacientes.

Separados por biombos, havia vários outros leitos ali. Edric baixou a cabeça e concordou, saindo. Foi recebido do lado e fora, com um abraço apertado de Fiorenza.

-Calma filho, vai dar tudo certo, tem que dar.


Katlyn e Alicia voltaram correndo da Suíça para os preparativos do enterro do senador. A pobre garota não sabia o que pensar, pois o homem morto era seu pai, e, ao mesmo tempo, seu maior inimigo. Ela também não viu a mãe chorar. Podia jurar que ela estava tão aliviada quanto ela, mas resolveu vestir a carapuça da esposa sofredora.

Sonya, apesar do estado do irmão, resolveu ir ao enterro do senador. Lera o dossiê sobre a vida dele e reconhecera Alicia. As duas haviam estudado juntas no ensino básico. Sonya lembrava-se de que tinha até inveja da outra, tão bonita e inteligente. Quando estavam no primeiro ou segundo ano, Alicia largou a escola para se casar.

A assassina se aproximou da viúva, que se comportava muito dignamente. Tocou-lhe delicadamente o ombro:

-Alicia, lembra de mim?...

-Sonya? - nunca esqueceu da colega, sempre se perguntou onde ela estaria.

-Eu sinto muito pelo seu marido - mentiu. - Vim aqui porque queria vê-la - agora era verdade. - Faz tantos anos…

-Obrigada.

Afastaram-se do caixão, indo conversar em um lugar mais privado. Sonya observou a ex-colega e pensou como ela estava estranha agora, parecendo uma heroína de videogame.

-Como me achou, depois de tanto tempo? - perguntou a viúva.

-Eu vi uma notícia na TV e reconheci o nome.

-Ah, sim, claro. Mas e você, como está? Casada?

-Estou, tenho dois filhos lindos.

-Oh, veja só, eu também tive dois. Edric não está aqui, está estudando em um colégio interno que eu não sei qual é. Meu marido não me disse. Você acredita? Agora ele está morto e eu não posso trazer meu menino de volta, nem pro velório do pai.

Sonya quase disse “eu sei onde seu filho está” mas se conteve.

-Fique tranquila, mais cedo ou mais tarde ele entra em contato com você e assim você poderá vê-lo.

-Não sei se ele vai querer me ver. Eu fui uma péssima mãe.

-Por que diz isso?

-Como eu não pude perceber que meu marido fazia aquilo com as crianças? Como?

-Calma. Como você saberia?

-Eu nunca dei um banho nos meus filhos, ele nunca deixou. Ele dizia que era trabalho para as empregadas, que eu não devia estragar minhas unhas com isso. Eu não os amamentei. Eu mal sou mãe deles, Sonya.

-Não diga isso, você é mãe deles, daria a vida por eles, não é?

-Sim, mas eu não pude protegê-los!

-Mas pode agora e é isso que importa.

Alicia chorava e Sonya a puxou para um abraço. Não conseguia se perdoar. A colega de infância a fez lembrar-se da vida antes do senador, uma vida alegre, sem preocupações. Chegou a lembrar-se de que sonhara em ser médica. Mas, a vida não permitiu.

-Sabe, Sonya, vou lhe contar uma coisa, um segredo meu. Edric não é filho do Irvin. É filho do grande amor da minha vida, que infelizmente não está mais entre nós. Eu fui tão burra. Se eu tivesse fugido com ele, tudo seria tão diferente.


-Não fique assim, veja meu exemplo: Meu irmãozinho está internado por causa de um acidente que eu meio que provoquei, você deve conhecê-lo ele andava frequentando a sua casa, tinha conhecido o senador.

-O Sebastian é seu irmão? Ele é um amor. Foi ideia dele tirar a Katlyn de casa. E eu não entendia por que ela ficou tão feliz com isso. Acho que ele sabia, não é?

-Não sei, se sim ele não comentou comigo. Mas olha, eu preciso ir. Meu irmão tá no hospital, muito doente, tenho duas crianças pequenas em casa e tudo o mais. Vou te dar meu telefone, você me liga e marcamos um café, pode ser?

-Claro, melhoras para ele.

-Mas, me liga mesmo, temos muito que conversar.

-Pode deixar.


Os dias iam passando e o estado de Sebastian ia melhorando aos poucos, já havia sido transferido para o quarto e já respirava sem ajuda de aparelhos, Edric ficava em seu quarto quase que período integral, vigiando seu “sono”. Fiorenza chegou a discutir com ele em alguns momentos, para que ele fosse para casa descansar e a deixasse cuidar um pouco do seu bebê. Os remédios que induziram o coma já haviam sido totalmente retirados, mas o caçula dos Sobakin não havia acordado ainda. Numa tarde de quarta feira, Edric estava segurando sua mão e falava com ele, muito baixo para não incomodá-lo:

-Seby, acorda pra mim, por favor? Eu te amo tanto, preciso de você aqui comigo, por favor? - abaixou a cabeça debruçando-se sobre o peito do enfermo chorando as lágrimas tão comuns.

Sebastian acordou sentindo o peso de Edric sobre seu peito, não tinha forças para falar ou esboçar alguma reação, ainda não entendia onde estava, usou toda a sua forças para apertar a mão que de Edric.

-Sebastian! - se sobressaltou quando sentiu o aperto ser retribuído. - Sebastian, você acordou! - exclamou, ao ver aqueles belos olhos abertos. Beijou as costas da mão dele. - Vou atrás de um médico, você não fecha esses olhos. - saiu correndo para achar uma enfermeira, um médico, qualquer um.

Estava mal humorado, mal acordara e sentia como se fosse um boneco, já havia passado por milhares de exames, não conseguia achar Edric, não conseguia falar direito, sentia como se seu corpo houvesse sido esmagado por um rolo compressor. Agora que voltara ao quarto, via toda sua família ali, queria dizer que estava tudo bem, para tirar aqueles olhares preocupados, mas não conseguia.

-Que susto você nos deu, em? - Scott foi o primeiro a se pronunciar.

-O que passou na sua cabeça, Sebastian? Sarin? Você poderia ter morrido… - Igor falava, gesticulava.

-Calma, pai, agora acabou. É bom te ver acordado, Seby, não faz mais isso não, tá?

Olhou para a direção da Sonya e viu Edric, não conseguiu desviar o olhar, ele parecia tão abatido, estava mais magro, com olheiras. Queria poder dizer que tudo ia ficar bem, mas não conseguia falar, de sua garganta só saia sons, nenhum palavra e isso o deixava mais irritado.

-Calma, Seby, você passou muito tempo entubado e ainda está muito debilitado, não força. - Samuel o impediu de prosseguir tentando.

-Isso, querido - agora era a mãe - descansa, pra ficar bem fortinho.

...


Sebastian segurou a mão de Edric e sentiu-a fria. A sua própria também tremia um pouco. Ouviu, muito baixinho, a tão desejada palavra: sim.

Nesses últimos cinco anos, haviam vivido tantas coisas e tão felizes que poderiam dizer que se haviam passado apenas cinco meses. O juiz pediu que ele repetisse: as testemunhas precisam ouvir, ele disse. E Edric repetiu: sim, nada me faria mais feliz.

-Podem se beijar - disse o juiz, e não precisou esperar muito para Sebastian agarrar o outro, dando-lhe um beijo profundo e sentido.

 Edric se consultava regularmente com a Rachel e o próprio Sebastian tinha acabado de ser liberado da fisioterapia.

A festa transcorreu muito bem. Amigos e parentes reunidos para celebrar o amor era algo maravilhoso, Edric já sentia-se em casa com a família Sobakin e Sebastian se adaptou bem a sogra e a cunhada, que agora se tratavam com terapias.

Scott também estava ali, com Viola - grávida - e a filhinha desta. Ela separara-se do marido após estourar o escândalo com a igreja. Jett não fora preso, mas sua moral estava por baixo.

O pequeno filho de Sonya - o mais novo - carregara as alianças.

Todos estavam muito felizes, e ansiosos por mais um capítulo nas suas vidas.


-s-s-s-s-s-s

E fim!

Queria pedir, mais uma vez, desculpas por atrasar tanto a postagem do último capítulo, mas, na semana passada, fiquei sem internet. Quando ela voltou, eu estava fazendo concurso e aí, vocês já sabem, né? Sim, hoje eu tive concurso de novo.  Por algum milagre, consegui postar.

Enfim, já recebemos pedidos de segunda temporada, mas estamos pensando (mais pra frente). Era pra finalizarmos com o lemon, mas não rolou.

Bom, obrigada pela paciência (e por lerem).

sábado, 24 de outubro de 2015

Criminal - Capítulo 4 - Verdades


Agora, finalmente, Seby vai contar a verdade ao Edric! Quem estava ansioso, pode ler rs

Criminal - Capítulo 4 - Verdades

Sebastian espirou fundo, iria contar a verdade mais cedo ou mais tarde, só não esperava que fosse tão cedo.

-Edric, você não sabe algumas coisas importante sobre minha família e sobre nossos negócios.

-Por exemplo, como você soube daquele leilão e foi parar lá?!

-É, isso também.

-Antes de você me explicar, me responde uma coisa: Tudo que você me disse foi verdade, não é? - já tinha lágrimas nos olhos, pensando que tudo não passava de uma mentira, que os abusos iriam continuar e que tinha confiado na pessoa errada.

-Claro que é! Eu nunca mentiria pra você. Eu disse e repito, ninguém, nunca mais, vai fazer nenhum mal a você.

Edric estava com os olhos úmidos:

-O que é então?

-Antes de começarmos essa conversa, senta aqui - apontou para o sofá, sentando logo em seguida. O jovem obedeceu, de cabeça baixa, mas a ergueu após sentar-se e olhou firme para o outro, esperando.

-Eu não sei por onde começar….

-Pode começar com a sua relação com o senador. Você disse uma vez que eu era um investimento a longo prazo, por quê? Por que me comprou?

-Bom começo - sorriu nervoso - Eu fui àquele leilão para me aproximar do Mr. Brooke e te comprei pelo mesmo motivo.

-E você queria se aproximar do senador por quê?

Sebastian respirou fundo e começou a escolher as palavras.

-Por que fui contratado para isso - nunca em sua vida havia tido dificuldade com as palavras.

-Contratado? Como assim? Sebastian, vai direto ao ponto, eu aguento.

-Com exceção do Scott, nossa família não é muito convencional aos olhos da sociedade, digamos que não andamos de acordo com lei.

-Direto. Ao. Ponto - interrompeu o jovem.

-Ok, eu fui contratado para matar o senador Brooke, por isso estava ali, por isso comprei você, eu precisa me inserir na rotina dos Brooke, eu a Sonya herdamos os negócios da família, somos assassinos.

Edric ficou paralisado. Assassino?


-Edric? Edric?

-É muita informação - sussurrou.

-É, eu sei

-Mas você vai, tipo, matar o senador?

-Vou, esse é meu trabalho. Como eu disse, Sonya e eu herdamos os negócios do papai.

-Teu pai era assassino também?

-Sim, ele e mamãe.

-Nossa! - Edric estava boquiaberto. Fora parar em uma família de assassinos profissionais, realmente não tinha sorte.

-É, imagino a sua cabeça. Bem, não somos psicopatas, nem matamos por diversão, tem haver com trabalho, são só negócios.

-Só negócios - resmungou, pensativo. - Quantas pessoas você já matou? Sabe?

-Nunca contei, mas várias. Desculpa se te decepcionei.

-Diria que me surpreendeu - respondeu

-Surpreendeu?

Edric passeava pela sala, observando as coisas como se nunca as tivera visto:

-Imaginei que você fosse um empresário normal. Quantos anos você tem?

-É, não sou nenhum pouco normal, tenho 22 anos.

-Nossa, como você é jovem. Imaginei que tinha uns 30.

-Eu tenho cara de velho, não fale isso para a Sonya.

Edric riu:

-Ela também quer parecer jovem, que nem a minha mãe?

-Não, a Sonya está bem com a idade.

Dessa vez ele ficou supreso:

-Como assim, bem com a idade?

-A Sonya tem a mesma idade da sua mãe, 34 anos, ela não liga para isso, só que odeia comentar.

-Ela é incrível - ficou por alguns minutos em silêncio, depois disse: - Vou dormir, pensar no que você me disse.

-Tudo bem, só mais uma coisa, não você não pode, sob hipótese alguma, comentar nada disso com ninguém. Você entende que não dizer nada disso a ninguém, não é?

-Ninguém acreditaria mesmo - e riu. - Boa noite, Sebastian.

-Boa noite, Edric, durma bem.

-Vai ser difícil dormir depois de tantas revelações.

E foi para o seu quarto, deixando Seby sozinho - mas não por muito tempo. O telefone tocou em seguida. Era Sonya.

-Maninho, pode falar?

-Posso.

-Olha só a ideia que eu tive: o deputado tem porte de arma. E se eu roubasse uma arma dele e você a usasse pra matar o mr. Brooke? Só para o caso do Sam não conseguir Sarin para nós.

-Pode ser.

-O que houve com você, maninho? Sua voz tá diferente.

-Acabei de contar toda historia para o Edric.

-Você o quê?! - ela pareceu nervosa. - E agora ele vai correr pra casa, contar pro senador e acabou nosso plano.

-Não acho, Sonya.

-Ah, verdade, tem o lance dos abusos. Acha que ele compactuaria com a morte do sujeito?

-Não sei, Sonya, não tenho ideia, ela foi dormir, não disse nada.

Ela suspirou.

-Vamos ter fé. Mas, por via das dúvidas, não deixa ele sair sozinho.

-Tá, pode deixar.

-Maninho, posso fazer uma pergunta?

-Adianta eu falar não, Sonya?

-Tudo bem que ele sofreu tanto, mas por qual motivo você se importa? Você nunca foi de ligar muito para as opiniões dos outros.

-Não tenho ideia, Sonya. Me pergunto a mesma coisa.

Ela fez barulho de beijinho.

-Tá gamadão nele, é?

-Não viaja, Sonya.

-Ele seria um bom cunhado. E os meninos adorariam tê-lo como tio.

-Sonya, nem se eu quissse ter alguma coisa com o Edric, Ele já sofreu tanto nessa vida! Tive uma conversa com a Rachel hoje, ela me disse que essa relação de confiança que ele tem comigo não deve ser quebrada.

-Ui, a Rachel. Tá certo, tá certo. Ah, falando nisso, vou jantar com o deputado. Quer alguma coisa dele?

-Joga conversa fora, fazendo ele odiar mais o senador e outra coisa: se aproxima para que ele confie cegamente em você.

-Sabe que sou especialista nisso.

-Não esquece de enrolar ele, ele não pode nem sonhar que é o Scott.

-Pensa que eu sou boba, maninho? Agora me deixa desligar, já estou atrasada.

-Tchau, Sonya, boa noite. - desligou o telefone e recostou-se melhor no sofá. Ficou pensando em toda aquela situação e acabou dormindo ali mesmo.

Edric havia levantado para tomar uma água e parou seu trajeto para observar o mais velho, que dormia desconfortavelmente no sofá. Gostava dele. Gostava muito. Sebastian lhe representava um porto seguro, a bóia de salvação. Mas não conseguia digerir direito a ideia de que ele fosse um assassino profissional, frio e calculista. Voltou ao seu quarto e pegou um edredom, com o qual cobriu o outro. Ficou alguns minutos velando o sono do mais velho, lembrando de como ele via certeza nos olhos dele, de como ele parecia saber de tudo. Não resistiu, e beijou-lhe a testa, arrependendo-se em seguida. Correu de volta para o quarto, e lá ficou a noite toda, acordado.

No dia seguinte, Katlyn acordou muito cedo, nervosa. Sua mão tremia tanto que ela mal conseguiu passar o lápis no olho. Estava certa de que Sebastian iria raptá-la, e levá-la para viver com ele em algum lugar bem distante do monstro que era o senador. Na aula de Educação Física, ela ficou olhando o relógio o tempo inteiro, ansiosa pelas nove e quinze. Sua amiga tentava lhe passar confiança, mas não estava dando muito certo. Quando deu o horário, as duas conseguiram escapar do olhar atento do professor.

-Eu nunca pulei esse muro. E se eu não conseguir subir?

-Relaxa, Kat, vai dar tudo certo. Eu te dou um pezinho.

A menina conseguiu subir, embora tenha se machucado um pouco no processo. Quando caiu do outro lado e não viu o seu salvador, quase teve um ataque do coração. Sentiu como se o chão lhe faltasse sob os pés. Minutos depois ele chegou com um boné, óculos escuros e uma blusa com capuz.

-Ai, graças a Deus, achei que não viria - ela quase o agarrou.

-Eu nunca falto a um compromisso.

A estudante enfim estava respirando:

-Vamos? - perguntou ansiosa.

-Aonde?

-Me diga você. Você veio me salvar do meu pai, não veio?

-Vim, mas não vou fugir com você.

A decepção apareceu estampada em neon no rosto da garota:

-E como vai fazer isso?

-Aqui dentro - Retirou de dentro da mochila um fichário rosa cheio de brilho - tem alguns saquinhos de cocaína, já ouviu falar?

Ela acenou com a cabeça.

-Você vai distribuir para alguns amigos e espalhar que tem a droga com para o máximo de gente que conseguir. Só lembre-se de guardar muitos pacotes com você, nos seus armários, bolsas, em todos os lugares.

-Eu vou presa, é assim que você vai me ajudar?

-Claro que não vai. Seu pai é o senador: você não será presa, mas terá que desaparecer por uns tempos, estudar fora, e, quando voltar, já vai ser maior de idade e vai poder fazer o que quiser de sua vida.

A garota pareceu pensativa por alguns instantes. Mas resolveu confiar naquele estranho que lhe estendia a mão, não era sempre que teria uma chance de viver longe daquele inferno.

-Vou fazer o que está dizendo. Mas sabe que não vai se casar comigo se tudo isso acontecer, não sabe?

-Não tenho a intenção de casar com você - riu quase gargalhando. - Eu sou gay.

Ela abriu a boca, surpresa.

-Você, gay? Não parece!

-Não, agora entra, que ninguém pode perceber seu sumiço.

Ajudou a menina a escalar o muro e sumiu daquele beco, lembrando de jogar em um rio próximo seu casaco, óculos e boné, não poderia correr o risco de que o ligassem a aquele “traficante”.

A amiga, ao ver Katlyn surgindo pelo muro de novo, ficou extremamente surpresa:

-Você não ia fugir com o tal cara?

-Não te conto, entendi tudo errado, acho que ele é policial e está investigando meu pai.

-Miga, que bafo!

-Mas vem, você me ajudar em mais uma missão.

-Que missão?

-Vem que eu te conto - saiu puxando a amiga escola adentro.

Sebastian deu algumas voltas na rua, antes de voltar onde havia deixado seu carro e dirigir de volta para casa. Chegou em casa e encontrou o mais novo sentado à mesa tomando o café da manhã.

-Bom dia, Edric - cumprimento-o sentando a mesa.

-Bom dia. Saiu cedo. Senta aí, come também. Você andou falando alguma coisa para a Marie? Ela não quis tomar café comigo.

-Não, mas acho que ela deve estar ocupada.

Depois de alguns minutos em silêncio, Edric disse:

-Eu não consegui dormir e fiquei lendo o livro da Rachel.

-E gostou?

-Eu não acreditei muito. Tem horas que parece que o terapeuta faz mágica. A pessoa não esquece, mas tipo reinventa o que passou. Li a história de uma moça que tinha sido violentada pelo pai. Ela tinha ficado tão traumatizada que “apagou” isso da mente dela e, com a terapia, ela conseguiu se lembrar e trabalhar a lembrança. Acha que a Rachel pode fazer esse tipo de coisa mesmo?

-Não sei, você quer tentar?

Edric pensou um pouco e então perguntou:

-Acha que ela é confiável?

-Acho, ela é quase esposa do Sam. Tenho certeza que ela é uma ótima psicóloga.

-Então acho que vou dar uma chance pra ela. Ou pra mim, tanto faz.

-Então se arruma e vamos ao consultório dela.

-Não tem problema chegarmos sem avisar?

-Não sei, acho que não. Agora vai e não demora, saímos em trinta minutos.

-Ok.

Saiu para se arrumar sendo seguido pelo mais velho.

O consultório de Rachel era cheio de penduricalhos. Na sala de espera, tinha um sofá cheio de almofadas coloridas com os símbolos dos chackras, e, na parede, um espelho, um baguá e um filtro dos sonhos pendurado no meio da sala

-Aqui é meio estranho, não acha? - já estava um pouco arrependido de estar ali.

-Igual à dona do espaço.

Não muito depois, a mulher apareceu com um cliente, do qual se despedia. Ela estava vestida com roupas largas, de algodão cru.

-Sebastian, Edric, que surpresa. Não esperava que viessem tão rápido. Ainda sem avisar.

-Imaginei que poderia nos atender e vim. O Edric gostou bastante do seu livro.

-O David é genial. Mas, enfim, entrem e vamos conversar melhor. Não gosto de conversar na sala de espera.

O consultório fedia a incenso. Sebastian se incomodou um pouco com o cheiro, mas resolveu ser simpático.

-Você tem interesse no EMDR, Edric? - perguntou a mulher assim que os três estavam acomodados.

-Não sei, no seu livro tudo parece tão mágico.

Ela riu:

-Perto das terapias tradicionais, parece milagre mesmo. É muito mais rápido o efeito, embora, no seu caso, vá demorar algumas sessões. Várias sessões.

-Por que várias sessões? - assustou-se com o comentário da psicóloga e segurou o braço de Sebastian intuitivamente.


-Vou tentar explicar - ela falava de um jeito calmo. - No EMDR, através de movimentos bilaterais, nós tentamos mudar as conexões cerebrais, de modo que a pessoa reprocesse o que aconteceu. Você não vai se esquecer do trauma, mas os sentimentos relacionados a ele vão se modificar e ele deixará de ser um trauma. Claro que, quanto mais antigo e profundo for o trauma, mais fortes serão as conexões cerebrais relacionadas a ele, e mais difícil será modificá-las.

-Eu não quero mais fazer isso - apertou mais forte a mão de Sebastian que assistia toda a situação calado.

-Por que não, querido?

-Por que… - tentou não chorar.

-Pode falar, Edric. - Sebastian tentou passar força.

-Por que eu não quero lembrar.

-Edric - a psicóloga falava de um jeito tranquilo, mas sério -, algumas pessoas passam por sofrimentos tão horríveis que se esquecem deles. Mas isso não é bom. O trauma continua lá, afetando a vida emocional da pessoa, embora ela não se lembre mais. O tratamento é para esse trauma não machucar mais você.

-E se der errado? Eu vou lembrar de tudo…

-Nós podemos começar com fatos menores, que não são tão traumatizantes para você, e ir “comendo pelas beiradas” até você se sentir seguro para falar e tratar o seu “grande trauma” - sugeriu. - O que você não pode fazer é ficar sem tratamento.

-Você concorda, Sebastian? Concorda que eu sou doente e preciso de tratamento?

-Ninguém disse que você é doente. A Rachel disse que você precisa de tratamento.

-Edric, eu trabalho com muitos pacientes que passaram pelas mesmas coisas que você. Alguns casos evoluíram para doenças psicológicas graves, como depressão. Você precisa trabalhar o que lhe aconteceu para isso não machucar ainda mais você.

O jovem Brooke não resistiu e começou a chorar. Sebastian não soube o que fazer, mas Rachel se limitou a entregar-lhe uma caixa de lenços e esperou pacientemente que ele se acalmasse, além de dirigir um olhar para Sebastian, dizendo “deixa ele chorar”. Edric chorou alguns minutos e começou a se acalmar, interrompendo o choro.

-Tenho uma proposta a fazer a vocês dois.

-Nós dois? - Sebastian surpreendeu-se.

-Sim. Claro, se você não se importar, Sebastian, gostaria de fazer uma sessão de EMDR com você para o Edric ver.

-Comigo?.

-Todo o mundo tem um trauma que incomoda, lá no fundo - virou-se para o mais jovem: - O que você acha, Edric? Isso te deixaria mais tranquilo?

-Sim.

-O que acha, Sebastian? Não é nenhum pedido absurdo. Eu mesma já fiz EMDR algumas vezes.

-Se isso te tranquiliza, Edric… Vamos, Rachel.

Ela pegou uma prancheta e alguns papeis. Em seguida, perguntou:

-Então, o que gostaria de tratar?

Sebastian parou para pensar. Não tinha nada pra tratar, era um cara bem resolvido e saudável. Tinha uma família maravilhosa que o amava e…

-Sinto que minha família não gosta tanto de mim quanto dos meus irmãos - respondeu, após uma breve hesitação.

Até mesmo Rachel se surpreendeu com a resposta, imaginava que iria tratar algo menos complexo. No entanto, se recuperou rapidamente:

-Poderia dar um exemplo? Uma cena em que isso tenha ficado evidente para você.

Dessa vez Sebastian não hesitou:

-Na última reunião familiar, Adrian foi abraçar Sam antes de mim, e chegamos ao mesmo tempo. Até ele prefere os outros.

Rachel se lembrava da cena. Tinha percebido um desconforto, mas logo o garoto correra para o outro tio. Anotou na folhinha. Em seguida, perguntou:

-Mas Sam não é padrinho do Adrian?

O homem baixou a cabeça, concordando. Depois, disse:

-É verdade. Eu sou um idiota mesmo, é só coisa da minha cabeça.

A psicóloga estava séria:

-O que importa agora são os seus sentimentos. Você sente essa cena como uma lembrança difícil, e uma prova de que não gostam de você?

-Sim, mas…

-Então vamos trabalhar isso. Agora, me diga, quando pensa nessa cena difícil, qual o grau de perturbação, de um a dez, que que você sente?

Edric observava a tudo, atento. Sebastian hesitou, hesitou, e, por fim, respondeu:

-Cinco.

Ela fez um risco no papel.

-Certo. E o que você pensa de negativo a seu respeito com relação a essa cena?

-Ninguém me ama.

Anotou.

-E o que gostaria de pensar a seu respeito que fosse positivo?

Aí ele hesitou. A terapeuta percebeu, e lhe entregou uma folha:

-Aqui tem várias opções de sentimentos positivos. Escolha o que mais lhe agradar.

Depois de uma pequena busca, ele disse:

-Sou amado e querido.

-Certo. Agora, vamos começar os movimentos. Você prefere que sejam movimentos visuais ou táteis?

-Visuais.

-Ok. Eu vou mexer os meus dedos de um lado para o outro, e você vai acompanhar com os olhos, enquanto pensa na lembrança difícil e no sentimento negativo. Se vier algum novo pensamento, deixe-o fluir, é normal. Se precisar que eu interrompa, apenas levante uma das mãos. Tudo bem?

Ele concordou com a cabeça, nervoso. A mulher começou os movimentos, que foram seguidos pelo paciente. Depois de alguns minutos, que, para Edric, pareceram uma eternidade, ela parou:

-Então, alguma sensação, sentimento, pensamento?

O rapaz hesitou.

-Pode falar. Qualquer coisa é importante, afinal, trata-se de você.

-Eu me lembrei… Lembrei que os meus irmãos me esqueceram num quarto escuro por um dia inteiro.

Edric ficou chocado. Nunca imaginara que aquelas pessoas tão legais podiam ter feito uma maldade dessas. A psicóloga não se alterou e principiou a explicar:

-Isso é muito comum, lembrar-se de cenas antigas relacionadas ao trauma trabalhando. Talvez esse seu sentimento de rejeição venha daí. Você quer trocar a lembrança difícil?

Ele olhou para o companheiro, que procurou dar-lhe força com um aceno de cabeça.

-Quero.

-E qual o grau de perturbação que você sente lembrando dela?

-Nove.

-E as palavras negativas “ninguém me ama” ainda fazem sentido para você?

-Fazem.

-E você quer trocar as palavras positivas?

-Não.

-Certo. Concentre-se nos movimentos da minha mão, enquanto se lembra da situação difícil.

Novamente, os movimentos. Edric não cabia em si de ansiedade. Aquilo se repetiu várias vezes, e o grau de perturbação do Sobakin ia baixando aos poucos. Trabalharam o medo do escuro, o medo da solidão, o abandono, depois reafirmaram as palavras positivas várias vezes, sempre com os movimentos da mão da terapeuta. Quando enfim o grau de perturbação chegou a zero, ela respirou fundo e perguntou:

-Quer um chá? Eu normalmente ofereço relaxamento para o meu paciente, mas, se conheço você, você não vai querer.

-Não, mas aceitaria uma conhaque se tiver.

Ela riu:

-Não tenho esse tipo de coisa aqui, até porque muitos dos meus pacientes fazem uso de remédios controlados. Como você está?

-Não sei te explicar, mas diria que bem.

-Viu, Edric? É assim que funciona o EMDR.

Ele se virou para o companheiro e perguntou, entre maravilhado e incrédulo:

-Você tá de boas mesmo?

-Sim, me sinto até mais leve, sabe?

-Caramba!

Rachel sorriu. Não esperava que Sebastian tivesse aqueles sentimentos, ele que sempre pareceu tão seguro de si. Depois pensou melhor e concluiu que era sim, possível, pois o rapaz sempre parecia um pouco distante do resto da família, como se não quisesse se entregar aos momentos que compartilhavam.

-Se sentir mais algo a esse respeito, ou quiser conversar, minha porta está sempre aberta, Sebastian. Saibam que o que é discutido aqui fica aqui. Eu jamais ousaria contar para alguém o que vi aqui.

-Fico feliz com isso, muito obrigado, Rachel.

-E quanto a você, Edric? Posso marcar um horário para você?

-Pode sim. - ainda tinha seus receios, mas se o Sobakin tinha tentado, por que não tentaria?

-Ótimo. Pode ser para sexta-feira?

Concordaram e marcaram. Depois, despediram-se da terapeuta, e deixaram-na com um novo paciente, uma moça loira muito gorda.

-Vamos comer, Edric, estou faminto.

-Vamos.

O jovem aproveitou a pequena refeição para crivar o mais velho de perguntas sobre como ele se sentira durante a terapia. Todas elas foram pacientemente respondidas. Depois, foram para o shopping comprar os presentes que Seby levaria para a família Brooke, à noite. Para Katlyn, Edric escolheu um bonito ursinho de pelúcia, com um coração escrito “I love you” e uma caixa de bombons.

-O senador vai achar que você está caidinho por ela - disse.

-É essa a ideia.

O jovem Brooke riu.

-Para minha mãe, leva esses brincos. Acho que iam ficar bem pra ela, são elegantes.

-Você tem bom gosto. E para o senador? Pensei em um whisky.

Edric fez uma careta de nojo:

-Não me obriga a comprar presente pra aquele tipo.

-Tudo bem, não precisa se incomodar.

-Queria rever a minha mãe e a Katlyn. Quando você as viu, como elas estavam?

-Bem, tenho que te contar uma coisa: A Katlyn vai para um colégio interno no exterior, vai ficar um bom tempo sem vê-la.

-Por quê?

-Sua mãe vai fazer uma cirurgia e ela ficaria sozinha com o senador. Por isso, se tudo der certo, ela vai para um colégio interno.

-Pra ficar livre do senador? Que bom! Ela… sofreu muito mais que eu, sabia? A cirurgia de silicone nos peitos foi para encobrir uma outra.

-Uma outra? - perguntou confuso.

Edric fez um gesto para o outro se aproximar e falou bem baixinho:

-É, de reconstrução de hímen, pra ela parecer virgem e conseguir um bom casamento.

Sebastian ficou estarrecido. Por isso o senador lhe garantira com tanta veemência que a garota era virgem.

-Entendo, é deve ser difícil para ela, passar por tudo isso sendo filha dele.

Edric baixou a cabeça, ficou em silêncio por um tempo, então disse:

-Eu sempre quis ajudar ela de algum jeito, e nunca soube como. Pensei até em contar pra mãe, mas ela sempre dizia que a mãe não iria acreditar.

-Não consigo imaginar sua situação.

-Sabe o que eu pensei agora? A dra. Rachel podia ajudar ela também.

-Quando toda essa história acabar, nós pensamos nisso, que tal?

-Tá!

À noite, Sebastian rumou para a casa do senador, que o recebeu como futuro genro.

-Desculpe vir sem avisar, mas não resisti. - mentiu sorrindo sedutor.

-Que é isso, você já é da casa, Sebastian. Pode vir a hora que quiser.

Alicia também sorria o seu sorriso de plástico. Katlyn não pôde conter a alegria sincera que a inundou:

-Sr. Sobakin!

-Oi querida, trouxe para você. - entregou o embrulho com o bichinho e os bombons. - Espero que sejam de seu agrado.

-Qualquer coisa vinda de você vai ser do meu agrado - respondeu ela, abrindo o presente. - Oh, meu Deus, que fofo! E eu adoro esses bombons! - Agarrou o pescoço dele, dando-lhe um abraço apertado, aproveitando para sussurrar em seu ouvido. - Obrigada, deu tudo certo.

-Vocês são perfeitos um para o outro - a mãe comentou.

-Concordo, Alicia, perfeitos. - o senador disse tentando esconder suas segundas intenções.

A menina largou o pescoço do “futuro marido” e foi na direção da mãe:

-Olha, mãe, que fofo!

A mulher examinou o bichinho, concordando.

-Tomei a liberdade de comprar para senhora, espero ter acertado. - entregou o par de brincos, que foi aberto com alguma ansiedade.

-Oh, são lindos! Muito obrigada.

O velho não se importou. Alicia não mais o seduzia, apesar de ter uma aparência extremamente cuidada. Antes de ela completar trinta anos, ainda conseguia ver nela a menininha com quem se casara, mas, agora, era só uma mulher, como outra qualquer.


-Não sei se é um amante das boas bebidas como eu, tomei a liberdade de lhe trazer um Dalmore 50 anos Decanter. - retirou a bela garrafa e entregou ao senador que quase babou, era um dos melhores whiskys que existiam, além de ser um dos mais caros: aquela garrafa fora comprada por no mínimo $15000 dólares.

-Que maravilha, Sebastian, meu caro! Venha, quero lhe mostrar minhas meninas dos olhos - e o puxou para uma bem fornida adega, onde havia diversas bebidas caríssimas. - Gostaria de experimentar essa maravilha comigo? - perguntou, pegando dois copos para uísque.

-Mas é claro. - precisava de um motivo para comentar sobre o deputado, uma única brecha para colocar esse assunto.

Beberem e conversaram sobre amenidades, além, claro, do senador não parar de falar sobre sua filha e sobre como ela seria uma ótima esposa. Lá pelas tantas, Sebastian largou:

-Estou feliz que tenhamos homens como o senhor na política. Senão…

-Mas o que houve? - perguntou o senador, enchendo pela milhonésima vez o seu copo.

-Não quero importuná-lo com isso, senador. - Se fez de desintendido.

-Oh, meu caro. Não me importuna. Eu adoro falar de política.

-É que não entendo como alguém possa ser eleito para o governar e mantenha negócios obscuros, ainda mais se passando como pastor e homem de bem. - Falou fingindo estar revoltado.

-Do que está falando? - o velho ficou interessado. Odiava pastores e suas malditas Igrejas.

-O deputado ou pastor, não sei direito, Robert Jett. - percebeu que os olhos do senador brilharam ao ouvir o nome. - As igrejas dele estão sendo investigadas pelo ministério público por tráfico de pessoas. Isso é um absurdo! E mesmo com a investigação, ele ainda se mantém firme no poder, com medidas absurdas.

O velho Brooke tomou um gole grande, e pareceu indignado, como se ele não estivesse fazendo o mesmo.

-Sou um idealista, senador. Acredito que um deputado não deve se prestar a esse papel - bebeu um gole de sua bebida, mostrando toda a sua indignação.

-Nesse ponto somos iguais, meu caro - o senador apoiou a mão esquerda sobre o ombro do homem que acreditava que seria seu genro.

-Desculpe importunar nossa conversa com esse assunto, mas gostaria de abrir os olhos da sociedade, deveria ter algo que pudesse fazer.

-E com certeza há, meu caro. E será feito.

-O problema é que eu não posso aparecer e dizer tudo que penso. Infelizmente o nome de minha família precisa ser sempre preservado em todas as hipóteses mas gostaria de ter o poder para desmascarar aquele deputadozinho.

-Não se preocupe, meu caro. Tomarei as medidas que estiverem à minha mão para resolver isso.

-É bom saber que, como cidadão, posso contar com o senhor, senador.

-É o meu dever - garantiu o velho.

Sebastian não aguentou ficar ali por mais muito tempo. Foi para casa, onde encontrou Edric desenhando:

-Como foi lá?

-Conforme o planejado.

-E como elas estão?

-Bem, sua irmã adorou o presente.

-Ela adora ursinhos - Edric sorriu. - Depois que acabar, minha irmã não vai ficar na escola, vai?.

-Não, quando acabar ela volta para sua mãe, e se ela quiser vai se tratar com Rachel como você tinha falado.

-Você contou pra minha mãe?

-NÃO! - levantou o tom de voz e assustou o menino. - Desculpa, sei que ela é sua mãe, mas ela não pode saber, seria perigoso.

-Eu nem tenho como contar, fica tranquilo - falou triste.

-Olha, desculpa, não deveria ter gritado. - respirou fundo. - Eu vou dormir, tivemos um dia longo, boa noite.

Edric ficou um pouco chateado e quis desenhar até mais tarde. Quando viu, já era mais de uma da manhã. Foi correndo para cama, como quisesse ocultar uma travessura.

No dia seguinte, às seis da manhã, Sebastian foi acordado pelo próprio telefone tocando. Atendeu, extremamente mal-humorado:

-Quem é?

Era Sam.

-Maninho, querido, você não imagina o que me aconteceu hoje!

-Às seis horas da manhã, imagino que nada.

O mais velho soltou uma risada sonora:

-O dia começou há seis horas já! Em seis horas, dá pra acontecer bastante coisa.

-Que seja, Samuel. Fala de uma vez!

-Ui, tá estressado? Te acordei?

-São Seis Horas.

-Ok, ok. O negócio é o seguinte: consegui o sarin. É um tubinho bem pequeno, mas tem o suficiente pra montar uma mini câmara de gás. Dá pra matar umas dez pessoas fácil. Bora fazer uma festa e convidar todos os nossos desafetos? Se bem que, pros meus, ia precisar uns dez tubos desse.

-Uau, pra quem disse que era difícil, conseguiu bem rápido.

-Por sorte, mr. Ching tinha um sobrando. Ainda consegui realizar uns outros negócios com ele.

-Por minha causa? Então mereço um bom presente de natal esse ano, seja criativo.

-Você? Quem merece sou eu, que faço todos esses sacrifícios por você e pela Sonya. Se quer saber, acabei de terminar de negociar o veneno com o mr. Ching, sabia? Eta véio difícil de se convencer.

-Estava brincando, Sam.

-De qualquer maneira, venham logo aqui em casa pegar. Rachel não gosta de ver essas coisas. Nem vaca ela quer matar.

Sam já tentara virar vegano, mas era simplesmente viciado em hambúrguer.

-Pode deixar, passo aí daqui a pouco, já me acordou mesmo.

-Ótimo, toma café comigo, aproveita que Rachel tem consulta cedo e não está aqui.

Sebastian sabia que o irmão gostava de beber álcool logo de manhã, ainda mais depois de virar a noite, por isso pegou uma garrafa fechada de conhaque, pedida favorita do mais velho, e rumou para casa dele.

Mais tarde, perto do meio dia, Sebastian recebeu um telefonema. Era Katlyn.

-Socorro, fui expulsa do colégio e meu pai quer me matar!

-Calma, era para isso acontecer mesmo, você está em casa?

-Sim, trancada no quarto.

-Ótimo. Vou praí.

Saiu praticamente correndo. Não podia demorar e dar a chance de o senador machucar seriamente a filha. O velho Brooke ficou muito surpreso ao ver Sebastian ali. Como ele podia adivinhar que estavam passando por um momento delicado?

-Katlyn não pode falar com você agora - disse. - Não é uma boa hora.

-É pelo o que aconteceu, eu vi na internet, por isso vim. - mentiu, só esperava que o senador acreditasse.

-Na internet? - o político ergueu uma sobrancelha.

-Sim. - torceu para que algum site realmente tivesse divulgado alguma coisa, qualquer mini nota já bastava.

-Mas já?! - o sujeito ficou ainda mais nervoso. Começou a andar de um lado para o outro, e acendeu um novo cigarro - sendo que ainda estava fumando o anterior. Depois de muitas demonstrações de desespero, disse: - Eu não acredito nisso. Uma menina criada aqui, ó, na palma da mão, bem educada, com tudo do bom e do melhor.

-Eu aposto que ela não tem nada a ver com isso senador, aposto que algum colega usou da sua ingenuidade para se favorecer. - se fez de desintendido para aliviar a situação.

-Ela espalhou pro colégio inteiro que estava vendendo! Tinha droga no armário e nas bolsas dela! Eu não sei o que fazer, Sebastian. E isso ainda já saiu na imprensa!

Essa maldita internet. O senador odiava a internet. Graças a ela, a audiência da TV Verdade havia caído, levando para o buraco muitos contratos milionários junto e seus podres ainda eram divulgados.

-Sobre a internet não é difícil de resolver, tenho um conhecido que consegue fazer essas notícias de quinta desaparecerem em um passe de mágica, se for do seu interesse ligarei para ele agora mesmo.

-Isso seria maravilhoso! Faça isso, por favor.

-Claro, mas por favor se acalme, está a ponto de ter um ataque, senador. - saiu retirando-se e ligando para a Sonya, seu marido era expert em internet, conseguiria criar e apagar uma notícia em poucos minutos.

Ficou algum tempo explicando pro cunhado a situação, afinal não era todo dia que alguém difamava e limpava um nome em menos de 30 minutos. Ao fim do telefonema, deu de cara com Alicia, que o observava. Se coração falhou em uma batida, será que ela havia percebido alguma coisa?

-Sr. Sobakin, meu marido confia muito no senhor. Por favor, diga para ele ser tolerante com a Katlyn. Ela é só uma criança.

-Pode deixar, Sra Alicia, vou conversar com ele. - foi ao escritório onde o senador o aguardava, ansioso:

-E então? Falou com ele?

-Falei sim senhor, em, no máximo, trinta minutos, nenhum vestígio do assunto será mais dito.

O velho pareceu extremamente grato. Então disse:

-Sebastian, você é o filho que eu gostaria de ter tido.

-Muito obrigado pelo elogio senador. Agora que o senhor está mais calmo, vamos falar da Katlyn.

-Eu entenderei se não quiser mais casar com minha filha, depois desse lamentável incidente - embora eu deseje, mais do que tudo, tê-lo como genro.

-Longe disso, senador, eu realmente aprecio a Katlyn. Como já lhe disse, toda essa situação deve ter sido por conta de sua ingenuidade, no máximo algum rompante de juventude. - passou-se por ingênuo, e pelo sorriso de canto do senador havia feito o discurso correto. - Porém, o senhor me entende que o nome de minha família não pode estar envolvido em um escândalo como esse, não é?

-Oh, claro, entendo completamente. Além disso, eu preciso tomar uma medida disciplinar para que essa situação não se repita. Tem alguma sugestão?

Bingo! Haviam chegado ao ponto que Sebastian desejava:

-Eu sugiro mandá-la para um colégio interno no exterior. Minha família tem contatos com um excelente. Apenas meninas e freiras, ambiente sadio e refinado. Pelo menos até o escândalo ser esquecido e tudo estiver resolvido.

O senador não gostou muito da ideia. Ficar longe da sua “menininha”? Quando ela voltasse, aos dezoito anos, já seria uma mulher e não teria mais graça nenhuma.

-Me parece uma medida um tanto severa, não acha?

-Se o senhor pensar em outra, estou à sua disposição, porém repito: por mais que eu goste da Katlyn, ela nunca seria aceita pela minha família, envolvida em um escândalo desse nível.

-Sim, claro. Por favor, me passe os contatos desse colégio. Você tem razão, é o melhor a se fazer.

-Além disso, senador, deve pensar em sua carreira. Se nenhuma medida for tomada, vão sujar sua imagem também. Sabe como alguns políticos podem jogar baixo. - pronto, se havia alguma dúvida na cabeça do senador ela foi totalmente removida.

O velho hesitou um pouco, então pôs a mão no ombro do mais jovem e disse:

-Sebastian, eu admiro muito isso em você. Jovem, mas seguro e decidido. Como eu. Somos extremamente parecidos, meu filho. Você falou exatamente o que eu diria, se não se tratasse da minha filha que tanto amo.

Sebastian sentiu o peso daquelas palavras, será que era realmente parecido com o senador?

-Desde a primeira vez que o vi, senti que havia uma ligação entre nós. Está escrito nos seus olhos. A maneira como você olhou para o Edric quando o comprou, a maneira como olha minha filha. Você é como eu, Sebastian, se seguisse o rumo da política, iria adorar lhe ter como aliado. - o senador baforou o cigarro. Depois, pensou, sentiria falta da Katlyn, mas a Yolanda, a cozinheira, tinha uma filha que estava para completar oito anos, daria um bom divertimento. Em seguida, chamou a empregada:

-Chame Alicia e Katlyn, temos uma excelente notícia para dar a elas.

-Deseja conversar a sós com sua família, senador? Se preferir eu me retiro. - ainda sentia o baque das palavras do senador, mas tentava recuperar-se.

-Não me importaria se você ficasse, mas você deve ter muito o que fazer. Não vou retê-lo por mais tempo.

Sebastian deu graças a Deus por isso e foi embora. No carro, respirou várias vezes seguidas, e, tenso, quase não conseguiu manobrar o carro.

Na casa dos Brooke, Alicia e Katlyn chegaram ao escritório do senador, que fumava, mais tranquilo:

-Filha, o que você fez foi muito grave - começou ele. A menina assentiu com a cabeça. - Mas estive conversando com o Sebastian, seu noivo, e ele me deu uma ótima ideia para resolver tudo.

Alicia respirou fundo. Que bom rapaz era esse Sebastian! No início fora contra casar a Katlyn - afinal, ela só tinha 15 anos - mas, agora, sabia que o marido fizera a melhor escolha.

-Vou enviá-la para um colégio interno no exterior, além de receber uma ótima educação, ficará longe de problemas.

Katlyn recebeu o baque da notícia, não sabia se ficava feliz por ficar longe de tudo ou triste, amava a mãe e os poucos amigos que tinha, não queria se distanciar deles, mas entendia que era a melhor maneira de se afastar de seu pai.

-Não teria uma outra maneira? - Alicia até tentou persuadir o marido, já estava longe de seu menino, agora de sua menina. Não suportaria a frieza daquela casa sem seus filhos.

-Não, Alicia, não há! Essa é a melhor maneira de abafarmos esse caso. Se quiser pode adiar sua cirurgia e ir com Katlyn, ajudando-a na mudança e adptação. - não teria sua princesinha, mas com alguns cuidados a filha da empregada pareceria uma princesinha também.

Então, a mulher se irritou. Estava cansada dos desmandos do marido, daquela solidão imensa, da falta que Edric fazia, da vida, de tudo. Gritou:

-Você NÃO vai tirar Katlyn de mim! Já basta ter tirado o Edric, sem me consultar, agora vai levar Katlyn? Eu não permito!

O velho ficou muito surpreso com a reação da esposa. Ela normalmente aceitava tudo tacitamente, e não era de gritar, nem de se irritar - criava pés de galinha. Logo, porém, se recuperou e foi firme:

-Graças à sua má educação, ela estava traficando drogas na escola. Se não fosse por isso, ela ficaria em casa como sempre foi!

-Minha má educação? Você que sempre me afastou dos filhos!

-CHEGA! - seu grito assustou a menina presente.

A menina não sabia onde se enfiar. Nunca havia visto os pais brigarem, e não estava acostumada a ser a razão das brigas. Morreu de vontade de dizer para a mãe “deixa, eu quero mesmo ir pra o colégio”, mas controlou-se.

-Quem manda nessa casa sou e eu sei o que é melhor, você gostando ou não. Se quer ficar perto de sua filha, vá com ela, não me importo, mas que a Katlyn vai para o colégio interno, ela vai e ponto final. - deu um tapa na mesa encerrando o assunto.

Alicia chegou a abrir a boca para bradar mais alguma coisa, mas não soube o que dizer. O que os casais se diziam exatamente quando brigavam por horas? Calou-se. Por mais que passasse na sua cabeça dar um fim naquela situação e lhe pedir o divórcio, pensava em seus filhos, o que seria deles, Katlyn ainda teria alguns direitos por seu filha, mas e Edric? Quem cuidaria dos estudos de seu menino? Respirou fundo. Chamou a filha para o quarto, e abraçou-a com muita força. Sentia-se a pior mãe desse mundo, e não era a primeira vez. Ao se sentir abraçada, Katlyn retribuiu, e, depois de um bom tempo, disse:

-Mãe, eu tou de boas. Não vai ser tão ruim esse colégio. - tentava acalmar a mãe que chorava mais ainda. - Além do mais, você virá comigo não é?

-Não sei, filha. Não sei se permitem. Acho que seu pai só falou aquilo pra me confortar.

-Qualquer coisa você aluga um apartamento perto do colégio, por mais que ele seja interno terei os finais de semana livre, e poderemos ficar juntas. Mãe, você precisa de férias do papai, eu vejo como ele te trata, venha, vai ser divertido. - queria tirar a mãe daquela casa, não a queria sozinha com o pai, afinal sabia do que ele era capaz.

Alicia não conseguiu responder: começou a chorar. Abraçou a filha outra vez. Claro, por que não? Adiar, talvez cancelar a plástica. Passara tanto tempo querendo se manter jovem e bonita que esquecera do que era mais importante na vida.


Sebastian estava tentando se tranquilizar desde que saiu da casa do senador, deixou o vidrinho do veneno com a Sonya para que ela conseguisse as digitais do deputado e rumou para casa. Precisava deitar um pouco, aquela conversa não tinha sido nem um pouco boa, as palavras do velho Brooke martelavam em sua cabeça, mas tentava acreditar que eram mentiras, que o Brooke só dissera aquilo pois sua atuação havia sido formidável desde o início, era somente isso. Chegou em casa e encontrou Marrie saindo, ela ia ao mercado ou algo do gênero, dissera que havia comida pronta e que o Edric estava no quarto lendo. O que ela não disse é que Edric não estava no próprio quarto, mas no de Sebastian. Este entrou, inocente, em casa, e rumou para o seu cantinho. Chegando lá, encontrou o mais jovem de cuecas, dormindo, com um monte de gibis espalhados pela cama.

Quase não se controlou, passado o susto inicial, ficou analisando as curvas do rapaz, como aquela cueca desenhava suas nádegas, como ele tinha um corpo magro, mas bem definido, e como suas pernas eram levemente torneadas.

Edric fora deitar lá porque queria ficar mais perto do Seby, sentir o seu cheiro. O que não imaginava é que iria dormir e ser flagrado lá.

Ficou mais algum tempo analisando aquele garoto, tão inocente, mas tão bonito e tão sensual, quando caiu em si já estava quase encostando naquele corpo perfeito, voltou a si antes que o fizesse, sentia seu baixo ventre arder de desejo.

-O que você ia fazer, Sebastian? - pensou reprimindo seu desejo. Sua primeira reação foi se recriminar e lembrar das palavras do senador “Você é igual a mim Sebastian. A maneira como você olhou para o Edric quando o comprou, a maneira como olha minha filha. Você é como eu, Sebastian”. Sentiu seu coração falhar na batida e lembrou do próprio Edric falando do senador “Ele é um monstro!”. Um monstro, era isso que era também: um monstro, igual ao senador.

Foi tomar um banho frio, para acalmar seu corpo, mas a mente não acalmava. Pensamentos iam e vinham em segundos, como balas. Deixou-se cair no chão do box do chuveiro e ficou ali, com a água lavando seu corpo e seus pensamentos. Estava claro: era um monstro, era por isso que sua família não o amava, era por que eles sabiam disso, sabiam que ele era um monstro, pior que o senador.

Ficou mais algum tempo sentindo a água gelada escorrer pela sua pele, até que ouviu a porta do banheiro sendo aberta. Era Edric, que, num estado de semiconsciência, viera urinar. Observou-o descer brevemente a cueca e começar a mijar. Seby queria morrer. Será que o menino não percebia o mal que lhe causava?

Aos poucos, o jovem despertou. Olhou em volta, e deu de cara com, sob o vidro jateado do box, Sebastian nu. Soltou um gritinho apavorado e sexy - o assassino não pôde deixar de notar. O mais novo saiu, quase correndo, e se trancou no quarto, repetindo como um mantra seu imbecil, o que você tava fazendo, seu imbecil, o que você tava fazendo. Quando, já em seu quarto, se acalmou, somente uma imagem vinha à sua cabeça, a imagem de Sebastian nu, sentado no chão do banheiro, molhado, com a água escorrendo por seu corpo. Precisava sair dali, arrumar um lugar para morar, sozinho, pra não fazer nenhum mal ao pobre Seby. Mas como? Como se sustentaria? Ao fim de todas as reflexões, decidiu que sairia para procurar um emprego, assim que desse. O pobre Sebastian, por seu lado, só faltava bater com a cabeça na parede, tamanho o ódio de si mesmo, e da situação. Imaginou-se chupando aquele membro, se beliscou, se arranhou, se mordeu. Sossega, imbecil, sossega. Esse menino já sofreu demais.

-s-s-s-s-s-s-s

O deputado Robert Jett foi inspirado em um conhecido político. Sim, vocês sabem qual. O lance do tráfico humano foi para ficar mais dramático.

Enfim, o próximo capítulo é o último. Finalmente, vocês saberão o que acontece com mr. Brooke, Edric, Sebastian e Katlyn. Não deixem de ler!

Leiam aqui:  capítulo cinco - final

Capítulo final

sábado, 17 de outubro de 2015

Capítulo 3: Família


Capítulo 3

Ainda era cedo e o sol já iluminava o recinto quando Sebastian acordou. Ele percebeu que o Edric ainda dormia e voltou a perder-se nas curvas dele, então bateram na porta. Era Marie:

-Trouxe o seu café. Já são dez horas.

-Obrigado, Marie, mas vou tomá-lo na mesa - levantou-se de cueca e foi ao banheiro tomar uma ducha e espantar o pequeno desejo que começara a sentir.


Quando Edric acordou, viu-se sozinho naquela cama enorme e ficou olhando em redor, tentando-se lembrar de onde estava. Em seguida, Sebastian adentrou o quarto com somente uma toalha enrolada na cintura.


-Que bom que acordou, pedi que servissem o café na mesa. Me acompanha?- perguntou de costas para o menino.

- Mas é claro! - respondeu, corando de leve. É verdade, viera dormir no quarto do Sebastian. Como pudera ter coragem?

-Então vá se arrumar, te espero na mesa - disse o dono da casa, entrando no closet para escolher sua roupa.


Edric sentiu uma pontada de desejo ao ver as costas nuas e úmidas do outro, e uma leve vontade de espiá-lo se trocar, mas se conteve e foi correndo para o seu quarto. Tomou um banho frio, vestiu uma roupa leve e, em menos de 10 minutos, já na mesa para tomar o desjejum, onde se surpreendeu por ter chegado primeiro.


Ficou ali, tamborilando com os dedos no prato, e esperando o dono da casa. Marie o recebeu com um sorriso e um alegre bom dia. Sebastian levou mais alguns minutos e apareceu elegantemente trajando uma roupa social finíssima.


-Vai sair? - perguntou o hóspede, após ficar alguns segundos boquiaberto.


-Vou, tenho assuntos para resolver. - disse sério não entrando em detalhes.


-Você sempre se veste assim? - e se arrependeu em seguida de ter feito essa pergunta. Mas já era tarde.

-Assim como?

-Tão… bem arrumado…

Sebastian achou graça e respondeu:

-Quando tenho reuniões importantes sim, mas quando estou de folga não, não estava social ontem no barco.

-Mas estava bem arrumado - rebateu, com um sorriso tímido.

-Que bobagem, estava de camiseta polo, bermuda e sunga. Todo mundo se veste assim. - continuava sorrindo para o mais novo.

-Eu nunca vi o senhor mal vestido - Marie comentou antes de se retirar para arrumar os quartos.

-Ela sabe das coisas - replicou, apontando para onde a empregada sumira.


-Deve ser herança do Scott: quando éramos menores, ele não tolerava que estivéssemos de qualquer jeito, ele cuidava até da roupa de praia, acho que, de tanto ele falar, eu aprendi.

-Quem é esse Scott? - comiam enquanto conversavam.

-Scott é meu irmão, um ano mais velho que a Sonya. O desgosto da família, como diria meu pai.

-Ovelha negra da família?

-Ele está mais para carneiro em uma família de lobos. - respondeu bebendo um copo de suco.

-Nada a ver. Você e a Sonya também são incríveis.

-Você conhece só a Sonya, além dela tenho mais dois irmãos: O Scott e o Samuel, o Samuel é um ano mais velho que o Scott, dois mais velho que a Sonya e quinze mais velho que eu.





-Nossa, deve ter sido legal ter irmãos mais velhos.





-Nos divertimos muito, o Sam era o líder ele que inventava as brincadeiras que eu poderia participar, o Scott tentava colocar juízo nossa cabeça, Sonya sempre protegia todo mundo e eu, bem, eu era a testa de ferro, sempre que eles ou a gente aprontava pesado, eu assumia a culpa.





-Por que você? - estava interessado nas histórias.





-Porque sou o mais novo e todo mundo me protegia, até os empregados.




Edric começou a rir:




-Devia ser muito divertido. Eu queria ter tido três irmãos.





Sebastian ergueu uma sobrancelha:essa era a hora que Edric contava tudo o que acontecia na mansão.




- Na mansão eu ficava a maior parte do tempo sozinho, eu meio que preferia assim. Eu brincava escondido - riu. - O senador fazia questão de ocupar o meu tempo com cursos e coisas do tipo, pra eu não incomodar, mas, mesmo assim, eu brincava escondido.




- Você brincava do quê? - perguntou interessado.




- Eu tinha vários brinquedos, minha mãe sempre comprou bastante brinquedo pra mim. Eu brincava com eles. Tem um lugar da casa que eu adorava brincar, tipo um porão, que ninguém ia. Mas um dia o senador me pegou lá e ficou muito furioso. Foi a primeira vez que ele me bateu. - se encolheu um pouco constrangido. - Ainda não entendi o porquê, mas nunca mais voltei lá.




-Você lembra o que tinha lá? - estava curioso com a história.




-Ah, um monte de sacos de papel e plástico. Tipo pacotes… Parecia lixo, eu achava que era tipo um depósito pra guardar coisas que não se queria. Devia ter voltado lá pra ver o que era.




Sebastian não era tão ingênuo: logo imaginou o que seriam esses “pacotes”.




- Edric, posso te fazer uma pergunta meio chata? Se você não quiser não precisa responder.




- Pode perguntar, não tem problema.




- Sua mãe sabia que o senador, ele bem... ele...




-Ele abusava de mim? - decidira-se a contar toda a verdade.- Ela não sabia, eu acho. - Estava esperando aquela pergunta desde o dia anterior.




-Se não quiser responder tudo bem. - não queria ir longe demais.




- Não tem problema. Sabe, falar é difícil, mas, depois, me dá um alívio. É como se eu não carregasse mais o peso sozinho.




Sebastian pensou que o menino merecia ajuda profissional. Ligaria para agendar uma consulta com a Dra. Rachel, ele precisava de ajuda.




-Pode falar comigo, sempre que quiser.




- Ele também maltratava minha irmã. Era um pesadelo, ele fazia coisas horríveis com a gente, e não podíamos nem chorar que era pior. Ele maltratava mais, porque sentia tesão de ver a gente chorando. Mas nada era pior que não podia piorar, quando minha mãe viajava ele ficava violento, já passei dois dias trancado, amarrado e vendado, foi o pior feriado da minha vida, foi a primeira vez que pensei seriamente em me matar - o garoto contava a história como se não fosse ele.- Mas eu não consegui, me senti um inútil.





-Ninguém sabia, os empregados? - estava perplexo.





-Não, tem os cômodos proibidos da casa, o porão, o quarto escuro, ninguém pode entrar, nem pra limpar. Além disso quando minha mãe viajava ou ia fazer uma cirurgia ele dava folga para os empregados, assim a mansão ficava vazia - e só aí começou a chorar e a soluçar. - Diz que ele nunca mais vai chegar perto de mim, diz.




-Nunca, eu juro. - estendeu a mão pegando a mão do mais novo e segurando com carinho. Ele encostou a testa no ombro do outro. E foi se acalmando aos poucos, bem devagar, até o choro passar. Só então perguntou:




- Você não tem compromisso? Não quero te atrasar.




-Tenho, você prefere ficar aqui ou na casa dos meus pais?




- Aqui, vi que você tem videogame. Posso?




-Claro, mas pega os jogos da caixa, que são os que já zerei.




-Tá com medo que eu zere os teus jogos? - e riu.




-Lógico, você terá tempo e eu nunca tenho. - sorriu levantando-se





- Tá bom então.





- Divirta-se e tente não perturbar a Marie.





Em seguida, Sebastian pegou seu carro e foi visitar Scott, o irmão mais velho, no escritório deste. Jogou charme para a secretaria e conseguiu esperar o irmão dentro do escritório. Quando Scott adentrou seu escritório levou um grande susto ao deparar-se com o caçula.




-Achei que tinha perdido a mania de invadir meus aposentos, maninho.





-Nunca - levantou e abraçou o irmão. - Como você está?





-Estou muito bem - respondeu o promotor, retribuindo o abraço. - Sinto sua falta. Devia me visitar mais. Por que não apareceu no último jantar que dei?





-Trabalho, mas também sinto sua falta.





-Mas sente-se - o mais velho pediu, indicando uma poltrona e fazendo o mesmo. - Só que eu sei que você veio me pedir alguma coisa, pra aparecer no meu escritório a essa hora.





-Mais ou menos, vou direto ao assunto ou explico a história? - essa era sua frase, desde criança era assim.





-Espere um minuto - Ligou para a secretária - Não quero ser incomodado em hipótese alguma, estou em reunião. - desligou o telefone. - Agora, vamos ao que interessa. Vá direto ao ponto - pediu, servindo-se de café.





-Você e sua nova namorada, amante, são os novos alvos da Sonya. - falou direto.





-Como?! A Sonya vai me matar?! Eu só briguei com a família, não era pra tanto!





-Claro que não, até porque a mamãe a mataria. - disse bebendo o café com tranquilidade.





-A mãe é uma mulher incrível. Mas me explica isso direito. Quem quer matar a mim e a Viola?




-O marido dela, quem mais?





Scott se afundou na poltrona. Claro, um pastor, contra até mesmo leis como o divórcio, não aceitaria ser traído pela esposa. Viola não queria se separar de jeito nenhum - embora o promotor já tivesse tocado nesse assunto com ela - e era extremamente obediente e submissa ao marido - exatamente como este desejava.




-Eu amo a Viola - sussurrou.




-Disse alguma coisa?




-Ah, não, nada. E o que Sonya pretende fazer a respeito? E o que você tem a ver com essa história?




-Quero incriminar o deputado Robert Jett pela morte do senador Mr. Brooke, assim ninguém vai ligar a morte dele à minha pessoa.




-E o que o senador tem a ver com tudo isso?




-Nossa, Scott, como você ganha um caso, sendo lerdo desse jeito - riu indignado com o irmão.


-Normalmente eu sei de detalhes dos casos antes do julgamento - rebateu.




-Dedução, dedução meu irmão, eu sou assassino profissional, mato pessoas, então lógico que o safado do senador tem tudo a ver com isso, ele é meu alvo - explicou.




-Ah, claro, como não pensei nisso - respondeu irônico. - Mas eu me lembro, maninho, de que você nunca precisou de bodes expiatórios pros seus assassinatos.




-Não, e você nunca foi alvo também.
Scott soltou um longo suspiro. Imaginara que não seria fácil se envolver com alguém como Viola, mas nunca imaginara que isso o colocaria na mira de uma dos assassinos mais perigosos do país. Sabia que sua irmã era terrível.




-Certo, Seby. Quer minha ajuda para incriminar mr. Jett pela morte de mr. Brooke, se entendi bem.




-Sim, agora sim, esse é meu irmão promotor, estava pensando em um processo do senador contra o deputado, algo do tipo.




-Eu não posso abrir um processo em nome de outra pessoa. O que posso, post mortem senatoris, é solicitar uma investigação junto ao ministério público mencionando o nome do deputado como provável assassino ou mandante do crime.




-Estava pensando, e se o senador abrisse uma investigação contra o deputado, seria um motivo para a morte? Precisamos de provas irrefutáveis.
Scott cruzou os dedos sob o queixo, pensativo. Após alguns minutos, disse:




-Como eu disse, só o senador pode abrir essa investigação - nova pausa para pensar. - Se eu conheço a Sonya, ela conseguiria convencer mr. Brooke a fazer isso.




-Ok, eu faço isso, ou ela faz, mas isso seria o bastante para condená-lo? Ele é deputado; vai ter um bom advogado.




-Condenar não, mas ele teria motivos para matar mr. Brooke, o que faz dele um suspeito.




-Ótimo, como promotor, o que é irrefutável, qual prova você precisa para uma condenação?




-Eu uso cada dado para provar uma culpa, mas quem condena é o juiz - em seguida, pareceu lembrar-se de alguma coisa. - Esse Jett não é “dono” da Igreja Amor em Cristo?




-Acredito que uma dessas
O promotor abriu uma gaveta, tirando de lá um maço de folhas.




-É secreto, mas vou te falar mesmo assim. O Ministério Público começou uma investigação contra essa igreja, por lavagem de dinheiro, mas descobriram que ela pode servir de fachada para tráfico de mulheres, que são recrutadas para “trabalhar em programas humanistas em países subdesenvolvidos” e são enviadas para a Europa como prostitutas escravas.




-O que acontece com esses governantes, são podres. - estava irritado e isso não passou despercebido pelo promotor.




-O nosso legislativo é um ninho de cobras - suspirou. - Infelizmente, o judiciário está igual. Mas, desde quando você se importa? Me conta a novidade.




-Não tem novidade, só nunca conheci alguém tão podre quando aquele maldito senador.




-Então você tem motivos pessoais pra fazer esse trabalho?




-Mais ou menos, mas vou ter gosto de acabar com aquele desgraçado.




-Voltando ao objetivo inicial. Você assiste à TV senado?




-Você sabe a resposta, óbvio que não.




-Pois deveria. O partido do Jett e o do Brooke se odeiam. Se o Brooke soubesse da investigação que está sendo movida contra a Igreja, isso ia ser notícia 24 horas por dia na TV do irmão dele - Scott sorriu maliciosamente. - Seria um bom motivo para matar Brooke.




-Ótima idéia, acho que alguém vai fazer algumas descobertas.




-E, de quebra, colocamos a opinião pública contra o deputado e a maldita Igreja.




-Boa, mas isso tudo ainda é muito, como você chama, circunstancial, quero uma prova mais concreta, daquelas que nenhum juiz pode negar.




-O ideal seria um vídeo do crime - o promotor respondeu, dando uma risada com o nariz.




-Muito engraçado, pensa, Scott, o promotor é você.




-Vamos lá: poderiam ser provas, digamos, as digitais do assassino na arma do crime. Não se esqueça de garantir que Jett não tenha álibi.




-Ah sim, uma boa dose de sonífero resolve, as digitais vai ser fácil, o jogo com o senador também.




-Posso saber qual será a arma do crime?




-Pode, um veneno de nome estranho que a Sonya vai arranjar para mim.




-Veneno… - o promotor pensava alto. Sentia-se igual aos políticos, fazendo isso, mas era seu irmão caçula, o que ele podia fazer? - Ele pode ser visto nas proximidades do local do crime, próximo à hora do assassinato. - Mas tinha uma coisa lhe incomodando naquela história. - Seby, o que o senador fez de tão grave, para você odiá-lo tanto? Normalmente são só negócios, não?




-Sim, Scott, você não quer saber, acredite. - conhecia o irmão bem o suficiente para saber que se contasse a polícia federal estaria naquela casa no outro dia e todos os seus planos iriam por água abaixo.




-Sabe que podemos tentar resolver isso dentro da lei, não sabe?




-Sei, e você sabe o que acho, vamos brigar se falarmos, então vamos fazer como sempre e não tocar nesse assunto.
Scott ergueu as mãos em sinal de paz:




-Ok, está certo. Pode levar esses papeis, mas não deixe o senador sonhar que fui eu quem deu essas coisas pra você, certo?




-Não quero os seus papeis, eles podem incriminar você, vou jogar uma conversa fora com o senador, sei que ele tem meios de descobrir tudo que você sabe e mais um pouco.




-Meu irmãozinho sempre cauteloso. Não é à toa que o pai acha que você é o melhor assassino que ele já viu.




-Tive bons tutores para aprender a ser cauteloso. - sorriu em resposta. - Agora sério, toma cuidado, Scott, se esse cara foi capaz de contratar um assassino, ele é capaz de qualquer coisa, sorte sua que ele contratou alguém da família. 

O promotor pareceu dividido entre sentimentos opostos por alguns segundos. Depois disse:




-Eu sei. Já tentei me separar da Viola, mas não consigo. E ela não tem coragem de se separar do marido.




-Você não precisa se separar dela, mas tenha cuidado. Tranque bem as portas, guarde bem as armas e não esqueça de ter sempre uma engatilha à mão. - estava preocupado.




-Quanto a isso, pode ficar tranquilo - e deu uns tapinhas no bolso da calça. - Recebi o mesmo treinamento que vocês, e aposto que sou mais rápido no gatilho que esse pastorzinho de merda - fez piada.




-Eu sei, mas qualquer coisa, liga pra gente, você sabe que mesmo se desligando da família ainda faz parte dela, não é, e que não importa o que aconteça, ninguém negaria ajuda, não é?




-Sei sim. Esse é o sonho da mãe, né? - sorriu comovido. - Como ela está?




-Está bem, deveria ligar pra ela, ela sente muito sua falta.




-Vou almoçar lá um dia, e levo a Viola. Vocês vão gostar dela, é a pessoa mais inteligente que eu já conheci.




-Quando isso tudo acabar, combinado?




-Combinado. Mal posso esperar para ver Robert Jett atrás das grades.



No mesmo dia, Sonya foi até o apartamento de Samuel, para resolver a sua parte do acordo. O irmão estava acompanhado por Rachel, sua noiva, a psicóloga.




-Quanto tempo, Rachel. Voltaram? 

Ela sorriu:

-É.

-O Sam está?

-Sim, ele está tomando banho. Mas espera um pouco que ele já vem.

As duas mulheres ficaram conversando banalidades até a chegada do irmão mais velho.

-SONYA! - ele gritou ao ver a irmã no apartamento.

-Samuel - recebeu o abraço carinhoso e protetor do irmão.

-Achei que vocês não vinham mais me visitar depois que faltei ao almoço domingo - brincou ele.

-Capaz, maninho. A mãe ficou triste, mas aceita desculpas - principalmente se você for visitá-la durante a semana com uma caixa de bombons suíços. 

O homem sorriu:

-Certo, eu vou. Mas você não trouxe os pimpolhos? Cadê meu afilhado?

-Hoje eu vim tratar de negócios. E é só ir lá em casa que você vê seus sobrinhos.

-Só vem na minha casa pra tratar de negócios e cobra visita. Que chato, mana.

Rachel, que não aceitava o trabalho do noivo, levantou-se do sofá e disse:

-Vou deixar vocês a sós. Se precisarem de mim, estou fazendo yoga e meditando.

Deixaram-na se retirar e aí Sonya disse:

-Como ela ficou bonita de cabeça raspada, né?

-Ela é linda Sonya, até pintada de verde. Eu disse pra ela não raspar, que eu não gosto de cabeça raspada. E sabe o que ela disse? “Você não precisa raspar”.

-Eu adoro ela, já disse isso?

-Até a mãe adora ela. Mas, diga: o que você aprontou agora?

 -Na verdade não fui eu, foi o Scott.

O irmão pareceu extremamente surpreso:

-O Scott? Aprontou alguma? Meu Deus, vai chover canivete!

-Deixa de ser besta Sam, o Scott está namorando, ficando, sei lá, a esposa do Deputado Jett.

-Deputado quem?

-Um fanático religioso de bosta, e o pior é que ele me contratou para matar a esposa e o amante.

-Peraí, devagar que eu sou lerdo. O nosso irmão santinho tá pegando uma mulé casada? Casada ainda por cima com um sujeito que te pagou pra matar teu próprio irmão?




-Olha, me surpreendeu, entendeu tudo dessa vez.




-Isso é de conviver com a Rachel - sorriu orgulhoso.




-O caso é que eu já conversei com o Seby, ele vai matar o senador pedófilo Brooke e vai incriminar o Deputado com a ajuda do Scott garanhão, assim eu não mato ninguém.




-São dois políticos? Sonya, vai com calma, que agora fiquei confuso.




-O Seby foi contrato para matar o Brooke, se aproximou dele para conhecer melhor a rotina, até comprou o filho que não é filho do senador em um leilão, e o deputado me contratou, quando descobri que meu alvo era meu irmão fui falar com o Seby, ele aproveitou que foi buscar o Edric, ah você tem que conhecê-lo ele é um fofo, e conversamos, daí o Seby me propôs essa idéia de incriminar o deputado - falou de uma vez.




-Eita, piorou. Senta, e vamos com calma. Tem dois políticos, o pedófilo e o corno, é isso?




-Sim. - já estava irritada com a lerdeza do irmão.




-Tá, um é o alvo do Seby e o outro é seu contratante?.




-Isso.




-O Seby vai incriminar o corno com a ajuda do Scott?.




-Isso mesmo.




-O que eu deixei passar?




-Nada de importante, eu acho.




-Então, onde eu entro nessa história?


Sonya suspirou. Essa era a parte fácil:




-Preciso de Sarin.




-Sarin? Está doida? Acha que isso se compra em qualquer esquina? 

Ela contornou o pescoço do irmão com os braços:




-Eu sei que não… Por isso vim pedir pro meu maninho que consegue qualquer coisa pra mim…




-Sonya, por que o Seby não dá um tiro na cabeça dele? Sarin, além de muito difícil de conseguir, é muito perigoso. Uma inalação acidental pode levar a óbito. Não é tão simples assim.




-Eu sei, o Seby não é idiota. Vai maninho, consegue pra mim, por favor. - desde pequena sempre conseguia tudo que queria com o irmão mais velho. 

Ele suspirou. Os caçulas não tinham medo de morrer não? Mas disse:




-Vou ver o que posso fazer. É pra logo?




-Para final da semana? - sorriu.




-Final da semana? - perguntou suspirando. - Tá, eu vejo o que eu faço, mas por favor tomem cuidado, Sarin é um veneno muito poderoso.




-Relaxa mano, somos cuidadosos. Ah, outra coisa, mas essa é fácil de se conseguir. Preciso de maconha.
Sam ergueu uma sobrancelha:




-Tá na vibe da erva, maninha? Olha que o papai te mata, hein?




-Não, idiota, é pro Seby.




Desde quando o Seby fuma maconha? E desde quando você virou a porta voz dele?
A mulher fez um gesto impaciente e respondeu:




-Não é pra ele fumar. Ele quer que a filha do Senador seja presa. Assim ele pode mover os pauzinhos dele e fazer o pai mandar ela para um colégio interno livrando-a assim dos abusos e maus tratos, Aff, hoje vocês está lento em Sam?




-E vocês acham que a filha do Senador vai ser presa por causa de um punhado de maconha?




-Mas vai ter um monte de jornais em cima cobrindo tudo, os partidos rivais essas coisa toda, e isso também é problema do Seby que se meteu nessa.




-Sonya, eu estava em coma? Por que ontem eu fui dormir e tinha um irmão que nunca ligou muito para as pessoas, acordo e ele tem um plano mirabolante para ajudar a filha do seu alvo. 

Novo gesto de enfado da mulher:




-Isso é com ele. 

Sam não disse mais nada: já desistira havia muito de discutir com os irmãos, porque eles pensavam rápido demais para alguém de raciocínio lento como ele. Levantou-se, com sua pachorra costumeira, e pegou um pacote quadrado e branco:




-Aqui tem um quilo de cocaína. Se um preto e pobre for pego com isso, é cadeia na certa. A mina é filha dum deputado, mas vai ter um trabalhinho pra explicar como isso foi parar com ela.




-O suficiente pra isso sair na imprensa?




-Isso depende dos contatos do véio. Mas diz pra ela ir pro colégio com isso e espalhar para os coleguinhas. No dia seguinte aparecem pais até do inferno pra expulsar ela do colégio. 

Sonya esfregou as mãos, empolgada. Era uma bela ideia.




-Você é o melhor irmão do mundo - e deu-lhe um beijo na bochecha.




-Eu sei, mas manda um recado pro Seby: quando ele quiser minha ajuda ele que venha pessoalmente - riu de volta. - Mais alguma coisa?




-Não. Era só isso.




-Isso e o almoço, você vai almoçar com a gente, não vai? A Rachel vai preparar lasanha.


Sonya quase fez uma careta: sabia que a psicóloga era vegana. Mas disse:




-Lógico que fico, é bom que te coloco a par das fofocas. Você tem que conhecer o Edric.




-Esse é o menino que o Seby comprou? Ele é o que, namorado dele?




-Não sei - ela deu de ombros. - O coitadinho foi tão abusado durante a vida que acho que vai ter trabalho pra levar uma vida sexual/afetiva normal. 

Foi aí que surgiu Rachel, com uma toalha nos ombros:




-Quem foi abusado?




-Edric, filho do senador Brooke. O Seby comprou ele num leilão. 

A moça pareceu horrorizada, mas depois falou:




-Estou participando de um projeto de psicólogos e psiquiatras específico pra quem sofreu abuso sexual. Talvez isso ajude o garoto. Isso é, se o Sebastian não estiver pretendendo abusar dele também.




-Oh, não, o Seby é tão bonzinho. Ele ficou furioso quando soube.




-Ah, minha vida, você não conhece o Seby direito, ele não aceita maus tratos, já perdi as contas de quantos animais ele me obrigou a resgatar. - Sam revelou tranquilo.




-E por que ele comprou um garoto num leilão? - Rachel não acreditava.




-Por que ele precisava se aproximar no senador, conhecer a casa e coisa e tal, e, outra: antes ele do que um velho tarado, não? - Sonya dizia como se fosse a situação mais óbvia da terra.


A psicóloga estava revoltada:




-O Senador Brooke é nojento. Sabiam que ele se casou com a esposa quando esta tinha apenas 16 anos?




-Informação interessante, Sonya pensou. Tudo isso estaria no dossiê que pedira para o marido fazer, mas era bom entender o que se falava do político por aí.




-Fizemos campanha contra ele na última eleição. Não deu certo, como pode ver - suspirou. - Às vezes a gente se desilude dessa vida de militância.




-Quer dizer que todos os podres dele estão em algum lugar, pra todo o mundo ver?
Rachel pareceu pensar um pouco:




-Devo ter alguns panfletos ainda lá em casa.




-Rachel, você deveria conversar com o Seby, ele sabe de muita coisa. - Sonya já unia as pontas, seu irmão iria adorar destruir o mundo do senador.




-Mas vocês não vão matar o manolo? - Samuel estava meio perdido no bate papo das mulheres.




-Mano, assassinar é uma arte e nosso irmão é o Picasso, ainda mais quando ele pega raiva de um dos seus alvos, ele quer destruir a vida do senador e expor seus podres seria um bom começo.




-Ah, tá, não tá mais aqui quem falou. 

A psicóloga ficava espantada em todas as conversas com o namorado e sua família, eles falavam de morte com uma naturalidade assustadora. Nessas horas, tinha vontade de se levantar e ir para a casa e nunca mais ver Sam na vida. Mas ela sabia que ia acabar voltando, porque amava ele demais.




-Amor, nós vamos almoçar que horas, estou faminto.




-A lasanha está assando. Não deve demorar muito.



Na mesma hora, Sebastian estava voltando para casa quando seu celular tocou. Era um número desconhecido, mas ele resolveu atender:




-Alô?




-Ai, graças a Deus, Sebastian. É a Katlyn. Tou ligando do celular da minha amiga. Ela sabe de tudo.




-O que aconteceu? - estacionou o carro para dar atenção à menina.




-Você disse que ia me ajudar, então precisa fazer isso logo. Minha mãe vai fazer mais uma cirurgia semana que vem, no dia 20. E eu vou ficar sozinha com o meu pai. Pelo amor de Deus, me ajuda! 

O homem ficou agradavelmente surpreso. Ia conseguir que o senador ficasse sozinho em casa e, melhor ainda, sem fazer nada! Só tinha um problema, seria bem antes do que esperava.




-Querida, fique tranquila, vou te tirar de lá em pouco tempo, consegue sair sem ser vista da escola amanhã? - torcia para que Sonya tivesse conseguido.




-Vou tentar. Tenho aula de educação física às nove horas e consigo pular o muro da rua Alphonso Tiger. É um beco atrás da escola. Sabe onde é? 

Rapidamente, Sebastian checou o GPS do carro. Não seria difícil encontrar.




-Sei.Te encontro às nove e dez nessa rua, fica tranquila, tenta dormir na casa da sua amiga hoje.




-Meu pai não te disse que ele nunca me deixa ir na casa das minhas amigas? Ele faz isso pra proteger minha virgindade - a última palavra foi dita com um sarcasmo amargo, a voz infantil embargada.




-Tá, não tem problema, até amanhã




-Até amanhã - ela estava chorando.

Sebastian desligou e telefonou para a irmã.




-Alô, maninho?




-Sonya, diz que o Sam te conseguiu a maconha.




-Melhor, estou aqui com ele - Sam retirou o telefone de seu ouvido.




-Sebastian, quando precisar de minha ajuda venha e fale comigo, pare de se esconder atrás da Sonya.




-Eu não me escondo atrás da Sonya! 

Em seguida, o interlocutor mudou de novo. Era a irmã:




-Maninho, a Rachel disse que sabe de um tratamento ótimo pro Edric. Devia trazê-lo aqui. E, ah, vem falar comigo que eu te dou o pacotinho pra Katlyn.




-Ela está aí?




-Oi, Sebastian, quer falar comigo? - mais uma vez o interlocutor mudou.




-Coloquem essa porcaria no viva voz! - o rapaz irritou-se. - Rachel, está ouvindo?




-Sim, estou - havia recebido a bronca, mas achara engraçado.




-Você vai fazer alguma coisa agora, pois estava pensando em ir aí agora, com o Edric.




-Você diz atendê-lo? Eu normalmente não atendo em casa mas posso conversar um pouco com ele.




-Ótimo vou passar em casa e levá-lo.




-Estamos no aguardo.




-Seby, você almoçou com o Scoty? Que besteira minha, claro que sim, a Rachel fez uma lasanha para comermos, você ia adorar. - se sentia mal por isso, mas conhecia o paladar e a sinceridade do irmão, ele não comeria aquela lasanha por nada e geraria um conflito.




-Que pena, Sonya, bem vou desligar. Me esperem: não demoro. - desligou sorrindo. 

Em alguns minutos, Sebastian chegava em sua casa. Encontrou Edric e Marie terminando de almoçar - juntos.




-Oi Sebastian, já almoçou? - Edric o recebeu sorrindo, tentando quebrar o clima com a Marie.




-Não, vou comer enquanto você se arruma, vamos sair.




-Aonde vamos?




-À casa do Sam, eu explico no caminho, agora vai lá se arrumar.




-Estou indo! Esse Sam é seu irmão, não é?
Só acenou com a cabeça, e começou a comer o restante de macarrão que estava em cima do fogão.




-Senhor, quer que eu faça alguma coisa? - ainda estava um pouco constrangida por estar sentada à mesa com o Edric.




-Não, Marie, obrigado. - voltou a dar atenção a sua comida. 

Seby estava terminando de comer quando o outro rapaz surgiu na porta:




-Estou pronto e ansioso pra conhecer seu irmão - disse. 

Sebastian mediu o garoto de cima a baixo, mas rapidamente se obrigou a voltar a si. Saíram. Na casa do irmão, foram recebidos pela Rachel:




-Você é Edric? Oi.




-Sou.




-Edric, essa é a Rachel - Sebastian apresentou-os.




-Sebastian!!!! - Samuel gritou chegando a entrada e puxando-os para dentro. 

Todos entraram, acompanhando o efusivo dono da casa.




-Achei que você não ia mais aparecer aqui, maninho! Está chateado comigo? O que foi que eu lhe fiz?




-Não seja tão dramático.




-Isso é o mesmo que pedir que Sam não seja Sam - Rachel brincou. - Edric, querido, gostaria de ver uma coisa lá dentro?




-O quê?




-Meus terrários, eu trouxe alguns deles para cá.


O rapaz aceitou o convite, deixando Sam, Sonya e Sebastian a sós.




-Olha só isso, Seby. Um quilo de cocaína em pequenos pacotinhos. Essa menina vai ser expulsa do colégio em dois tempos.




-Só diz pra ela espalhar pros colegas que tá com a droga - frisou o irmão.




-Vou ter que adiantar meus planos, ele vai ficar sozinho dia vinte, vou te....




-Quê, dia vinte?! E tu acha que eu sou o quê, mágico? Como que eu vou conseguir sarin em uma semana?!




-Você ia conseguir para o final da semana, menos drama - era a vez da Sonya de situar o irmão.




-Ia? - o coitado estava perdido. - Eu te falei que é difícil de conseguir, mana!




-Por favor, Sam, senão vou perder essa chance.




-Não é assim que funciona, mano. Vamos combinar o seguinte: eu vou tentar conseguir o sarin. Tentar. Se eu não conseguir a tempo - e é provável que eu não consiga -, você dá outro jeito de matar ele. Sei lá, tiro na cabeça, mercúrio, cianeto, o que for.




-Mas mexa seu pauzinhos - Sonya já dizia impaciente.




-Já disse que vou fazer o possível!




-Tudo bem, qualquer coisa eu dou jeito.

Enquanto isso, Rachel tentava ganhar a confiança de Edric:

-Gosta de terrários?

-Acho… acho que sim. O que são terrários, mesmo?


-São aquários usados como vasos de suculentas. Olha esse. Eu plantei cinco tipos de suculentas.

-Legal.


-Você tem algum hobby?


-Não.


-Nem um? Você tem cara de quem gosta de quadrinhos. Gosta de quadrinhos?


-Gosto de videogame. - disse dando os ombros.


-Oh, videogame. E qual é o seu jogo preferido?


-Não sei, gosto de vários: Assassin’s Creed, Mortal Kombat, Resident Evil 4, NeverDead, Manhunt, pensando bem acho que, de todos, Manhunt é meu favorito.

A mulher sentiu um calafrio percorrer a espinha. Parece que esse menino veio parar na família certa. Sorriu amarelo:


-Você leva o hobby bem a sério, ou é só passatempo mesmo? Digo, tem vontade de fazer cosplay e outras coisas?


-Não sei, nunca fui de fazer muitas escolhas - deu os ombros novamente.


-Mas não tem vontade?


-Não sei se tenho vontade, acho que você não entenderia - sorriu triste, o que não passou despercebido pela psicóloga, que constatou que o caso era “um pouquinho” mais complicado que o descrito pela provável futura cunhada.


-E por que eu não entenderia?


-Você já foi abusada?

Ela se surpreendeu. Normalmente os pacientes não eram tão diretos com relação a essas coisas.


-Mas isso é horrível!


-Viu, não entende - desviou voltando-se para as plantas.

Ela ficou por alguns minutos em silêncio, deixando o menino pensar. Então disse carinhosamente:


-Querido, posso não entender, mas estudei muitos anos para tentar. Sou psicóloga. Deixe-me ajudá-lo.


-Eu não preciso de ajuda, você não pode me fazer esquecer de tudo que passei, não pode trazer meu pai de volta, então não pode fazer nada.


-Há muitos meios de reverter uma coisa ruim, Edric. Você pode começar de novo.


-Eu estou começando de novo, por algum motivo o Sebastian me deu uma nova chance e isso já é o suficiente.


-Venha, sente-se aqui - puxou-o para um divã. - Gostaria de lhe pedir uma chance.


-Uma chance?


-Sim, uma chance. Uma vida como a que você teve não se supera simplesmente pondo uma pedra por cima. Já atendi muitas pessoas com problemas parecidos, sabia? E todas elas precisavam recomeçar.


-Parecidos? Você não tem ideia do que passei nesses dez anos.

Ela suspirou. Achou melhor não insistir. No entanto, ainda tinha uma cartada.


-Ok, vou aceitar sua recusa, mas com uma condição.

-Diga.

A mulher se levantou, pegou um livro da estante e entregou ao rapaz:

-Leia esse livro. Fala um pouco sobre a terapia que venho desenvolvendo, e como os pacientes reagem a ela. Se, ainda assim não quiser tentar, eu não lhe importuno mais.


-Tudo bem, vou ler. - sorriu para a psicóloga.

Sebastian interrompeu o momento.

-Atrapalho?


-Não. - Edric respirou aliviado ao ver o mais velho.


-Que bom que apareceu, precisava mesmo falar com você.


-A Sonya disse. Edric você pode me esperar na sala?


-Posso - disse e saiu com o livro nas mãos.


-Sebastian, o que vai fazer com esse garoto quando se cansar dele?


-Me cansar? Do que você está falando?


-Você comprou ele em um leilão para se aproximar do senador. O que vai fazer quando conseguir tudo que quer? Ele não é um brinquedinho que você usa e joga num canto - o convívio com aquela família a fez ser mais direta.

Sebastian olhou para ela com o canto dos olhos, pensando. Essa pergunta já havia sido feita para ele, pelo seu pai, havia muitos dias. O que fazer com Edric depois de a missão ter sido cumprida? Depois de muito pensar, havia chegado a uma solução, que não o agradava mas que parecia ser a única possível:


-Devolvê-lo para a mãe. Ela acha que ele está estudando no exterior.

Rachel recebeu a notícia num misto de surpresa e alívio. Até que enfim alguém naquela bendita família demonstrava algum bom senso.


-Obrigada, Sebastian.


-Pelo o quê, não lhe fiz nada.

A psicóloga sorriu. Ele nem imaginava como aquilo lhe dava esperança de que Sam também mostrasse seu lado humanitário, de que havia luz no fim do túnel para aquele relacionamento estranho entre os dois.


-Mais alguma coisa, Rachel?


-Não, Sebastian.


-Aproveitando então, eu queria saber se você pode atender o Edric, ele é meio abalado


-Eu estava conversando com ele sobre isso agora. Pelo que Sonya me contou, ele foi abusado pelo próprio pai, não foi?


-Ele não é pai dele, é padrasto, não que isso mude muita coisa, mas pelo que ele me contou o pai morreu.

Rachel lembrou-se de que o garoto tinha falado algo a respeito do pai falecido.


-Eu conversei com ele. Ele está relutando em receber o tratamento, mas eu te peço que não insista com ele. Dei-lhe um livro para ler...


-Vou conversar com ele, pode deixar, mas já aviso que não sou o mais indicado.


-É justamente isso que estou dizendo. Não toque nesse assunto com ele, só se ele vier falar. Quero que ele decida por si mesmo. Ele pareceu não ter muita iniciativa, pelo que eu vi.


-Ele não tem mesmo, tive dificuldade com isso no inicio de nossa convivência e -ah- tenho uma pergunta.


-Diga.


-O Edric teve pesadelos ontem, e só conseguiu dormir quando foi ao meu quarto e deitou-se comigo.


-Ele se deitou com você?


-Sim, o que me preocupa é por que insônia gera uma séries de problemas físicos.

A mulher estava pensativa. O que aquilo podia significar? Normalmente pessoas que sofrem abusos têm muitas dificuldades de se entregar a um relacionamento, mesmo de amigos, e mais dificuldade ainda em manter contato físico íntimo, como dormir junto com outras pessoas.


-Há quanto tempo ele está na sua casa?


-Não lembro, parece que nos conhecemos há anos, mas não faz uma semana.


-Muito estranho…


-O que é estranho?


-Como um rapaz que sofreu do jeito que ele sofreu se entregou tão facilmente a um relacionamento? - Rachel examinava sua estante mental quase desesperada, procurando um livro que a ajudasse a explicar o que estava acontecendo.


-Que relacionamento? - Sebastian quase gargalhou. - Não existe relacionamento, ele confia em mim, só isso.


-Acredito - ela falou pacientemente - que confiança seja a base da maioria dos relacionamentos. Novamente, é muito estranho que ele confie em alguém tão rápido.


-Eu nunca fiz nada que ele não quisesse. E prometi que ninguém faria ele fazer algo que não quisesse. Talvez seja isso que tenha acontecido. 

Ela ainda não estava satisfeita. Faltava uma peça naquele quebra-cabeça.


-Sebastian, se o Edric resolver se consultar comigo, vou querer marcar uma sessão contigo para saber exatamente o que aconteceu nesses dias.


-Sim, tudo bem.


-E só mais uma coisa: não se apaixone por ele.

Sebastian quase engasgou.


-Desculpe, apaixonar?


-Muitas vezes acontece. A ideia da vítima é muito atrativa para muitos homens. Há uma mistura de pena e desejo de poder.


-Entendo, mas não me apaixonaria.


-Ele se sentiria traído se isso acontecesse - avisou a mulher.

O assassino percebeu que isso era verdade, e se lembrou das vezes em que tinha achado Edric atraente. E agora se achava um monstro, até pior que o senador.

Por sorte, Sam apareceu na porta logo em seguida. Ele trazia uma latinha de cerveja na mão e falava alto:


-Chega de papo cabeça, galera. Vamos beber!


-Não bebo cerveja, Sam, esqueceu?


-Não é pra você, Seby, é para minha linda aqui. - entregou a latinha para a noiva, que aceitou. - Quer uísque? Tem uísque aqui também, maninho.


-Conversaremos mais outra hora, Sebastian. Tem meu cartão?


-Não preciso, sei onde te encontrar.


-Ih, nem conta com aqui em casa, porque ela tá trabalhando demais.


-Exagerado - e beijou-lhe a boca.

Sebastian, porém, ficou com o aviso na cabeça e resolveu ir para casa, para pensar com calma. Edric não relutou, embora Sonya e Sam ficassem bem aborrecidos.


-Já?!


-Para com isso, Sonya, essa casa nem é sua - o caçula riu.

Acabaram indo embora, e a irmã também resolveu sair, pois deixara os pequenos com a babá, e estava ansiosa para ver se o marido terminara o dossiê sobre os alvos. À noite, Seby recebeu um e-mail com os dossiês em pdf. No corpo da mensagem, apenas três frases:

“Conteúdo baphonico. Detalhe para ‘deputado Jett tem porte de arma’. Te amo, maninho.”


Ele leu o conteúdo do email e não se surpreendeu, a maioria das informações já conhecia, e o resto imaginava. O Senador viera de uma família rica, estudara nas melhores universidades, e, ainda jovem, colecionava crimes de trânsito, como dirigir embriagado e sob efeito de drogas, ou acima do limite de velocidade. Durante sua vida, envolvera-se em três acidentes com morte, e, nos três, estava embriagado e a quase duzentos por hora. Em um deles, inclusive, fora constatado que ele estava sob o efeito de ecstasy. Isso nunca fora a público. Os policiais que anotaram esse efeito foram remanejados para uma cidadela no interior.


Sebastian continuou lendo. As festinhas do senador, em que se exploravam menores de idade, foram flagradas algumas vezes pela polícia, mas os casos nunca vieram a público nem foram alvos de investigação mais acurada. Um delegado que ousara levar isso à imprensa perdera seu cargo e fora processado por difamação. Ele foi encontrado morto dois anos depois, atropelado por um trator, pois mudara-se para o campo após a exoneração.


O rapaz já estava sentido ânsias de vômito. Passou os olhos pelo resto do documento, encontrando crimes de praxe, como doações para campanhas de fontes não identificadas, sonegação de impostos e a suspeita de que era o verdadeiro dono da TV Verdade, e seu irmão não passava de um laranja. Mas te todas as informações, as pessoais era as que mais lhe interessavam.


56 anos. Comprador costumaz de charutos cubanos e bebidas finas, sendo a sua preferida o uísque Glenfiddich 1937. Costuma vestir-se com apuro e tem um alfaiate particular, que o visita em casa para confeccionar seus ternos de linho e camisas de seda. Tem uma pequena coleção de relógios caríssimos, que troca conforme a ocasião.


Atualmente, é dono de três carros de luxo, um Mc Laren MP4 2012, Mercedes Bens SLR e um BMW X6. Em geral, troca de carro a cada ano. Gosta de música erudita e visita óperas sempre que possível. Nunca escondeu sua admiração por Giovanna Antonina, grande soprano que conheceu pessoalmente em uma de suas viagens à Itália.


Passou para o deputado, cujo dossiê leu com menos atenção, pois Sonya se responsabilizaria por ele. Além dos dados que já conhecia, como o envolvimento com lavagem de dinheiro da Igreja, Sebastian descobriu que o jovem Robert havia sido um delinquente juvenil de uma família de classe média baixa, usuário e pequeno traficante de drogas, pelo que fora preso havia 20 anos. Depois de 5 anos na cadeia, convertera-se à Igreja Amor em Cristo, e fora crescendo dentro da “corporação”. Ganhou prestígio e candidatou-se a deputado, e, ao ser eleito, “levara com ele” mais dois do mesmo partido. Levava uma vida luxuosa e gostava de jogar golfe.


Ficou mais um tempo observando dossiê quando foi interrompido pelo Edric:


-Ainda trabalhando? - Edric estava vestindo um calção e uma camiseta regata.

-Ainda, e você não deveria estar dormindo? - respondeu

O jovem olhou de relance os papeis que seu novo amigo segurava, e leu, rapidamente, "Irvin Brooke" no topo.

-O que… é isso? - perguntou tremendo. Só ouvir aquele nome lhe dava arrepios.

-Calma Edric.

-Por que você tem esses papeis, o que é isso? É sobre o senador Brooke, não é?




-s-s-s-s-s-s-s




Tcha-rãm! *musiquinha de suspense* Agora vocês vão ter que esperar mais uma semana pra saber o resto. mwhahahahaha

No próximo capítulo: Penúltimo capítulo! Seby conta tudo para o Edric! Como ele vai reagir?
Os dois vão experimentar a "terapia nova" da Rachel. Sebastian vai jantar na casa do senador - e puxar o saco dele, claro.

Não esqueçam de comentar! 

Ps: estamos planejando uma nova série (mas uma fanfic) com um casal bem incomum e muita putaria gratuita e desnecessária. Quem aí gostaria de ler?

Beijos, e até o próximo sábado!

Leiam aqui o capítulo 4:
capítulo quatro - verdades