sábado, 17 de outubro de 2015

Capítulo 3: Família


Capítulo 3

Ainda era cedo e o sol já iluminava o recinto quando Sebastian acordou. Ele percebeu que o Edric ainda dormia e voltou a perder-se nas curvas dele, então bateram na porta. Era Marie:

-Trouxe o seu café. Já são dez horas.

-Obrigado, Marie, mas vou tomá-lo na mesa - levantou-se de cueca e foi ao banheiro tomar uma ducha e espantar o pequeno desejo que começara a sentir.


Quando Edric acordou, viu-se sozinho naquela cama enorme e ficou olhando em redor, tentando-se lembrar de onde estava. Em seguida, Sebastian adentrou o quarto com somente uma toalha enrolada na cintura.


-Que bom que acordou, pedi que servissem o café na mesa. Me acompanha?- perguntou de costas para o menino.

- Mas é claro! - respondeu, corando de leve. É verdade, viera dormir no quarto do Sebastian. Como pudera ter coragem?

-Então vá se arrumar, te espero na mesa - disse o dono da casa, entrando no closet para escolher sua roupa.


Edric sentiu uma pontada de desejo ao ver as costas nuas e úmidas do outro, e uma leve vontade de espiá-lo se trocar, mas se conteve e foi correndo para o seu quarto. Tomou um banho frio, vestiu uma roupa leve e, em menos de 10 minutos, já na mesa para tomar o desjejum, onde se surpreendeu por ter chegado primeiro.


Ficou ali, tamborilando com os dedos no prato, e esperando o dono da casa. Marie o recebeu com um sorriso e um alegre bom dia. Sebastian levou mais alguns minutos e apareceu elegantemente trajando uma roupa social finíssima.


-Vai sair? - perguntou o hóspede, após ficar alguns segundos boquiaberto.


-Vou, tenho assuntos para resolver. - disse sério não entrando em detalhes.


-Você sempre se veste assim? - e se arrependeu em seguida de ter feito essa pergunta. Mas já era tarde.

-Assim como?

-Tão… bem arrumado…

Sebastian achou graça e respondeu:

-Quando tenho reuniões importantes sim, mas quando estou de folga não, não estava social ontem no barco.

-Mas estava bem arrumado - rebateu, com um sorriso tímido.

-Que bobagem, estava de camiseta polo, bermuda e sunga. Todo mundo se veste assim. - continuava sorrindo para o mais novo.

-Eu nunca vi o senhor mal vestido - Marie comentou antes de se retirar para arrumar os quartos.

-Ela sabe das coisas - replicou, apontando para onde a empregada sumira.


-Deve ser herança do Scott: quando éramos menores, ele não tolerava que estivéssemos de qualquer jeito, ele cuidava até da roupa de praia, acho que, de tanto ele falar, eu aprendi.

-Quem é esse Scott? - comiam enquanto conversavam.

-Scott é meu irmão, um ano mais velho que a Sonya. O desgosto da família, como diria meu pai.

-Ovelha negra da família?

-Ele está mais para carneiro em uma família de lobos. - respondeu bebendo um copo de suco.

-Nada a ver. Você e a Sonya também são incríveis.

-Você conhece só a Sonya, além dela tenho mais dois irmãos: O Scott e o Samuel, o Samuel é um ano mais velho que o Scott, dois mais velho que a Sonya e quinze mais velho que eu.





-Nossa, deve ter sido legal ter irmãos mais velhos.





-Nos divertimos muito, o Sam era o líder ele que inventava as brincadeiras que eu poderia participar, o Scott tentava colocar juízo nossa cabeça, Sonya sempre protegia todo mundo e eu, bem, eu era a testa de ferro, sempre que eles ou a gente aprontava pesado, eu assumia a culpa.





-Por que você? - estava interessado nas histórias.





-Porque sou o mais novo e todo mundo me protegia, até os empregados.




Edric começou a rir:




-Devia ser muito divertido. Eu queria ter tido três irmãos.





Sebastian ergueu uma sobrancelha:essa era a hora que Edric contava tudo o que acontecia na mansão.




- Na mansão eu ficava a maior parte do tempo sozinho, eu meio que preferia assim. Eu brincava escondido - riu. - O senador fazia questão de ocupar o meu tempo com cursos e coisas do tipo, pra eu não incomodar, mas, mesmo assim, eu brincava escondido.




- Você brincava do quê? - perguntou interessado.




- Eu tinha vários brinquedos, minha mãe sempre comprou bastante brinquedo pra mim. Eu brincava com eles. Tem um lugar da casa que eu adorava brincar, tipo um porão, que ninguém ia. Mas um dia o senador me pegou lá e ficou muito furioso. Foi a primeira vez que ele me bateu. - se encolheu um pouco constrangido. - Ainda não entendi o porquê, mas nunca mais voltei lá.




-Você lembra o que tinha lá? - estava curioso com a história.




-Ah, um monte de sacos de papel e plástico. Tipo pacotes… Parecia lixo, eu achava que era tipo um depósito pra guardar coisas que não se queria. Devia ter voltado lá pra ver o que era.




Sebastian não era tão ingênuo: logo imaginou o que seriam esses “pacotes”.




- Edric, posso te fazer uma pergunta meio chata? Se você não quiser não precisa responder.




- Pode perguntar, não tem problema.




- Sua mãe sabia que o senador, ele bem... ele...




-Ele abusava de mim? - decidira-se a contar toda a verdade.- Ela não sabia, eu acho. - Estava esperando aquela pergunta desde o dia anterior.




-Se não quiser responder tudo bem. - não queria ir longe demais.




- Não tem problema. Sabe, falar é difícil, mas, depois, me dá um alívio. É como se eu não carregasse mais o peso sozinho.




Sebastian pensou que o menino merecia ajuda profissional. Ligaria para agendar uma consulta com a Dra. Rachel, ele precisava de ajuda.




-Pode falar comigo, sempre que quiser.




- Ele também maltratava minha irmã. Era um pesadelo, ele fazia coisas horríveis com a gente, e não podíamos nem chorar que era pior. Ele maltratava mais, porque sentia tesão de ver a gente chorando. Mas nada era pior que não podia piorar, quando minha mãe viajava ele ficava violento, já passei dois dias trancado, amarrado e vendado, foi o pior feriado da minha vida, foi a primeira vez que pensei seriamente em me matar - o garoto contava a história como se não fosse ele.- Mas eu não consegui, me senti um inútil.





-Ninguém sabia, os empregados? - estava perplexo.





-Não, tem os cômodos proibidos da casa, o porão, o quarto escuro, ninguém pode entrar, nem pra limpar. Além disso quando minha mãe viajava ou ia fazer uma cirurgia ele dava folga para os empregados, assim a mansão ficava vazia - e só aí começou a chorar e a soluçar. - Diz que ele nunca mais vai chegar perto de mim, diz.




-Nunca, eu juro. - estendeu a mão pegando a mão do mais novo e segurando com carinho. Ele encostou a testa no ombro do outro. E foi se acalmando aos poucos, bem devagar, até o choro passar. Só então perguntou:




- Você não tem compromisso? Não quero te atrasar.




-Tenho, você prefere ficar aqui ou na casa dos meus pais?




- Aqui, vi que você tem videogame. Posso?




-Claro, mas pega os jogos da caixa, que são os que já zerei.




-Tá com medo que eu zere os teus jogos? - e riu.




-Lógico, você terá tempo e eu nunca tenho. - sorriu levantando-se





- Tá bom então.





- Divirta-se e tente não perturbar a Marie.





Em seguida, Sebastian pegou seu carro e foi visitar Scott, o irmão mais velho, no escritório deste. Jogou charme para a secretaria e conseguiu esperar o irmão dentro do escritório. Quando Scott adentrou seu escritório levou um grande susto ao deparar-se com o caçula.




-Achei que tinha perdido a mania de invadir meus aposentos, maninho.





-Nunca - levantou e abraçou o irmão. - Como você está?





-Estou muito bem - respondeu o promotor, retribuindo o abraço. - Sinto sua falta. Devia me visitar mais. Por que não apareceu no último jantar que dei?





-Trabalho, mas também sinto sua falta.





-Mas sente-se - o mais velho pediu, indicando uma poltrona e fazendo o mesmo. - Só que eu sei que você veio me pedir alguma coisa, pra aparecer no meu escritório a essa hora.





-Mais ou menos, vou direto ao assunto ou explico a história? - essa era sua frase, desde criança era assim.





-Espere um minuto - Ligou para a secretária - Não quero ser incomodado em hipótese alguma, estou em reunião. - desligou o telefone. - Agora, vamos ao que interessa. Vá direto ao ponto - pediu, servindo-se de café.





-Você e sua nova namorada, amante, são os novos alvos da Sonya. - falou direto.





-Como?! A Sonya vai me matar?! Eu só briguei com a família, não era pra tanto!





-Claro que não, até porque a mamãe a mataria. - disse bebendo o café com tranquilidade.





-A mãe é uma mulher incrível. Mas me explica isso direito. Quem quer matar a mim e a Viola?




-O marido dela, quem mais?





Scott se afundou na poltrona. Claro, um pastor, contra até mesmo leis como o divórcio, não aceitaria ser traído pela esposa. Viola não queria se separar de jeito nenhum - embora o promotor já tivesse tocado nesse assunto com ela - e era extremamente obediente e submissa ao marido - exatamente como este desejava.




-Eu amo a Viola - sussurrou.




-Disse alguma coisa?




-Ah, não, nada. E o que Sonya pretende fazer a respeito? E o que você tem a ver com essa história?




-Quero incriminar o deputado Robert Jett pela morte do senador Mr. Brooke, assim ninguém vai ligar a morte dele à minha pessoa.




-E o que o senador tem a ver com tudo isso?




-Nossa, Scott, como você ganha um caso, sendo lerdo desse jeito - riu indignado com o irmão.


-Normalmente eu sei de detalhes dos casos antes do julgamento - rebateu.




-Dedução, dedução meu irmão, eu sou assassino profissional, mato pessoas, então lógico que o safado do senador tem tudo a ver com isso, ele é meu alvo - explicou.




-Ah, claro, como não pensei nisso - respondeu irônico. - Mas eu me lembro, maninho, de que você nunca precisou de bodes expiatórios pros seus assassinatos.




-Não, e você nunca foi alvo também.
Scott soltou um longo suspiro. Imaginara que não seria fácil se envolver com alguém como Viola, mas nunca imaginara que isso o colocaria na mira de uma dos assassinos mais perigosos do país. Sabia que sua irmã era terrível.




-Certo, Seby. Quer minha ajuda para incriminar mr. Jett pela morte de mr. Brooke, se entendi bem.




-Sim, agora sim, esse é meu irmão promotor, estava pensando em um processo do senador contra o deputado, algo do tipo.




-Eu não posso abrir um processo em nome de outra pessoa. O que posso, post mortem senatoris, é solicitar uma investigação junto ao ministério público mencionando o nome do deputado como provável assassino ou mandante do crime.




-Estava pensando, e se o senador abrisse uma investigação contra o deputado, seria um motivo para a morte? Precisamos de provas irrefutáveis.
Scott cruzou os dedos sob o queixo, pensativo. Após alguns minutos, disse:




-Como eu disse, só o senador pode abrir essa investigação - nova pausa para pensar. - Se eu conheço a Sonya, ela conseguiria convencer mr. Brooke a fazer isso.




-Ok, eu faço isso, ou ela faz, mas isso seria o bastante para condená-lo? Ele é deputado; vai ter um bom advogado.




-Condenar não, mas ele teria motivos para matar mr. Brooke, o que faz dele um suspeito.




-Ótimo, como promotor, o que é irrefutável, qual prova você precisa para uma condenação?




-Eu uso cada dado para provar uma culpa, mas quem condena é o juiz - em seguida, pareceu lembrar-se de alguma coisa. - Esse Jett não é “dono” da Igreja Amor em Cristo?




-Acredito que uma dessas
O promotor abriu uma gaveta, tirando de lá um maço de folhas.




-É secreto, mas vou te falar mesmo assim. O Ministério Público começou uma investigação contra essa igreja, por lavagem de dinheiro, mas descobriram que ela pode servir de fachada para tráfico de mulheres, que são recrutadas para “trabalhar em programas humanistas em países subdesenvolvidos” e são enviadas para a Europa como prostitutas escravas.




-O que acontece com esses governantes, são podres. - estava irritado e isso não passou despercebido pelo promotor.




-O nosso legislativo é um ninho de cobras - suspirou. - Infelizmente, o judiciário está igual. Mas, desde quando você se importa? Me conta a novidade.




-Não tem novidade, só nunca conheci alguém tão podre quando aquele maldito senador.




-Então você tem motivos pessoais pra fazer esse trabalho?




-Mais ou menos, mas vou ter gosto de acabar com aquele desgraçado.




-Voltando ao objetivo inicial. Você assiste à TV senado?




-Você sabe a resposta, óbvio que não.




-Pois deveria. O partido do Jett e o do Brooke se odeiam. Se o Brooke soubesse da investigação que está sendo movida contra a Igreja, isso ia ser notícia 24 horas por dia na TV do irmão dele - Scott sorriu maliciosamente. - Seria um bom motivo para matar Brooke.




-Ótima idéia, acho que alguém vai fazer algumas descobertas.




-E, de quebra, colocamos a opinião pública contra o deputado e a maldita Igreja.




-Boa, mas isso tudo ainda é muito, como você chama, circunstancial, quero uma prova mais concreta, daquelas que nenhum juiz pode negar.




-O ideal seria um vídeo do crime - o promotor respondeu, dando uma risada com o nariz.




-Muito engraçado, pensa, Scott, o promotor é você.




-Vamos lá: poderiam ser provas, digamos, as digitais do assassino na arma do crime. Não se esqueça de garantir que Jett não tenha álibi.




-Ah sim, uma boa dose de sonífero resolve, as digitais vai ser fácil, o jogo com o senador também.




-Posso saber qual será a arma do crime?




-Pode, um veneno de nome estranho que a Sonya vai arranjar para mim.




-Veneno… - o promotor pensava alto. Sentia-se igual aos políticos, fazendo isso, mas era seu irmão caçula, o que ele podia fazer? - Ele pode ser visto nas proximidades do local do crime, próximo à hora do assassinato. - Mas tinha uma coisa lhe incomodando naquela história. - Seby, o que o senador fez de tão grave, para você odiá-lo tanto? Normalmente são só negócios, não?




-Sim, Scott, você não quer saber, acredite. - conhecia o irmão bem o suficiente para saber que se contasse a polícia federal estaria naquela casa no outro dia e todos os seus planos iriam por água abaixo.




-Sabe que podemos tentar resolver isso dentro da lei, não sabe?




-Sei, e você sabe o que acho, vamos brigar se falarmos, então vamos fazer como sempre e não tocar nesse assunto.
Scott ergueu as mãos em sinal de paz:




-Ok, está certo. Pode levar esses papeis, mas não deixe o senador sonhar que fui eu quem deu essas coisas pra você, certo?




-Não quero os seus papeis, eles podem incriminar você, vou jogar uma conversa fora com o senador, sei que ele tem meios de descobrir tudo que você sabe e mais um pouco.




-Meu irmãozinho sempre cauteloso. Não é à toa que o pai acha que você é o melhor assassino que ele já viu.




-Tive bons tutores para aprender a ser cauteloso. - sorriu em resposta. - Agora sério, toma cuidado, Scott, se esse cara foi capaz de contratar um assassino, ele é capaz de qualquer coisa, sorte sua que ele contratou alguém da família. 

O promotor pareceu dividido entre sentimentos opostos por alguns segundos. Depois disse:




-Eu sei. Já tentei me separar da Viola, mas não consigo. E ela não tem coragem de se separar do marido.




-Você não precisa se separar dela, mas tenha cuidado. Tranque bem as portas, guarde bem as armas e não esqueça de ter sempre uma engatilha à mão. - estava preocupado.




-Quanto a isso, pode ficar tranquilo - e deu uns tapinhas no bolso da calça. - Recebi o mesmo treinamento que vocês, e aposto que sou mais rápido no gatilho que esse pastorzinho de merda - fez piada.




-Eu sei, mas qualquer coisa, liga pra gente, você sabe que mesmo se desligando da família ainda faz parte dela, não é, e que não importa o que aconteça, ninguém negaria ajuda, não é?




-Sei sim. Esse é o sonho da mãe, né? - sorriu comovido. - Como ela está?




-Está bem, deveria ligar pra ela, ela sente muito sua falta.




-Vou almoçar lá um dia, e levo a Viola. Vocês vão gostar dela, é a pessoa mais inteligente que eu já conheci.




-Quando isso tudo acabar, combinado?




-Combinado. Mal posso esperar para ver Robert Jett atrás das grades.



No mesmo dia, Sonya foi até o apartamento de Samuel, para resolver a sua parte do acordo. O irmão estava acompanhado por Rachel, sua noiva, a psicóloga.




-Quanto tempo, Rachel. Voltaram? 

Ela sorriu:

-É.

-O Sam está?

-Sim, ele está tomando banho. Mas espera um pouco que ele já vem.

As duas mulheres ficaram conversando banalidades até a chegada do irmão mais velho.

-SONYA! - ele gritou ao ver a irmã no apartamento.

-Samuel - recebeu o abraço carinhoso e protetor do irmão.

-Achei que vocês não vinham mais me visitar depois que faltei ao almoço domingo - brincou ele.

-Capaz, maninho. A mãe ficou triste, mas aceita desculpas - principalmente se você for visitá-la durante a semana com uma caixa de bombons suíços. 

O homem sorriu:

-Certo, eu vou. Mas você não trouxe os pimpolhos? Cadê meu afilhado?

-Hoje eu vim tratar de negócios. E é só ir lá em casa que você vê seus sobrinhos.

-Só vem na minha casa pra tratar de negócios e cobra visita. Que chato, mana.

Rachel, que não aceitava o trabalho do noivo, levantou-se do sofá e disse:

-Vou deixar vocês a sós. Se precisarem de mim, estou fazendo yoga e meditando.

Deixaram-na se retirar e aí Sonya disse:

-Como ela ficou bonita de cabeça raspada, né?

-Ela é linda Sonya, até pintada de verde. Eu disse pra ela não raspar, que eu não gosto de cabeça raspada. E sabe o que ela disse? “Você não precisa raspar”.

-Eu adoro ela, já disse isso?

-Até a mãe adora ela. Mas, diga: o que você aprontou agora?

 -Na verdade não fui eu, foi o Scott.

O irmão pareceu extremamente surpreso:

-O Scott? Aprontou alguma? Meu Deus, vai chover canivete!

-Deixa de ser besta Sam, o Scott está namorando, ficando, sei lá, a esposa do Deputado Jett.

-Deputado quem?

-Um fanático religioso de bosta, e o pior é que ele me contratou para matar a esposa e o amante.

-Peraí, devagar que eu sou lerdo. O nosso irmão santinho tá pegando uma mulé casada? Casada ainda por cima com um sujeito que te pagou pra matar teu próprio irmão?




-Olha, me surpreendeu, entendeu tudo dessa vez.




-Isso é de conviver com a Rachel - sorriu orgulhoso.




-O caso é que eu já conversei com o Seby, ele vai matar o senador pedófilo Brooke e vai incriminar o Deputado com a ajuda do Scott garanhão, assim eu não mato ninguém.




-São dois políticos? Sonya, vai com calma, que agora fiquei confuso.




-O Seby foi contrato para matar o Brooke, se aproximou dele para conhecer melhor a rotina, até comprou o filho que não é filho do senador em um leilão, e o deputado me contratou, quando descobri que meu alvo era meu irmão fui falar com o Seby, ele aproveitou que foi buscar o Edric, ah você tem que conhecê-lo ele é um fofo, e conversamos, daí o Seby me propôs essa idéia de incriminar o deputado - falou de uma vez.




-Eita, piorou. Senta, e vamos com calma. Tem dois políticos, o pedófilo e o corno, é isso?




-Sim. - já estava irritada com a lerdeza do irmão.




-Tá, um é o alvo do Seby e o outro é seu contratante?.




-Isso.




-O Seby vai incriminar o corno com a ajuda do Scott?.




-Isso mesmo.




-O que eu deixei passar?




-Nada de importante, eu acho.




-Então, onde eu entro nessa história?


Sonya suspirou. Essa era a parte fácil:




-Preciso de Sarin.




-Sarin? Está doida? Acha que isso se compra em qualquer esquina? 

Ela contornou o pescoço do irmão com os braços:




-Eu sei que não… Por isso vim pedir pro meu maninho que consegue qualquer coisa pra mim…




-Sonya, por que o Seby não dá um tiro na cabeça dele? Sarin, além de muito difícil de conseguir, é muito perigoso. Uma inalação acidental pode levar a óbito. Não é tão simples assim.




-Eu sei, o Seby não é idiota. Vai maninho, consegue pra mim, por favor. - desde pequena sempre conseguia tudo que queria com o irmão mais velho. 

Ele suspirou. Os caçulas não tinham medo de morrer não? Mas disse:




-Vou ver o que posso fazer. É pra logo?




-Para final da semana? - sorriu.




-Final da semana? - perguntou suspirando. - Tá, eu vejo o que eu faço, mas por favor tomem cuidado, Sarin é um veneno muito poderoso.




-Relaxa mano, somos cuidadosos. Ah, outra coisa, mas essa é fácil de se conseguir. Preciso de maconha.
Sam ergueu uma sobrancelha:




-Tá na vibe da erva, maninha? Olha que o papai te mata, hein?




-Não, idiota, é pro Seby.




Desde quando o Seby fuma maconha? E desde quando você virou a porta voz dele?
A mulher fez um gesto impaciente e respondeu:




-Não é pra ele fumar. Ele quer que a filha do Senador seja presa. Assim ele pode mover os pauzinhos dele e fazer o pai mandar ela para um colégio interno livrando-a assim dos abusos e maus tratos, Aff, hoje vocês está lento em Sam?




-E vocês acham que a filha do Senador vai ser presa por causa de um punhado de maconha?




-Mas vai ter um monte de jornais em cima cobrindo tudo, os partidos rivais essas coisa toda, e isso também é problema do Seby que se meteu nessa.




-Sonya, eu estava em coma? Por que ontem eu fui dormir e tinha um irmão que nunca ligou muito para as pessoas, acordo e ele tem um plano mirabolante para ajudar a filha do seu alvo. 

Novo gesto de enfado da mulher:




-Isso é com ele. 

Sam não disse mais nada: já desistira havia muito de discutir com os irmãos, porque eles pensavam rápido demais para alguém de raciocínio lento como ele. Levantou-se, com sua pachorra costumeira, e pegou um pacote quadrado e branco:




-Aqui tem um quilo de cocaína. Se um preto e pobre for pego com isso, é cadeia na certa. A mina é filha dum deputado, mas vai ter um trabalhinho pra explicar como isso foi parar com ela.




-O suficiente pra isso sair na imprensa?




-Isso depende dos contatos do véio. Mas diz pra ela ir pro colégio com isso e espalhar para os coleguinhas. No dia seguinte aparecem pais até do inferno pra expulsar ela do colégio. 

Sonya esfregou as mãos, empolgada. Era uma bela ideia.




-Você é o melhor irmão do mundo - e deu-lhe um beijo na bochecha.




-Eu sei, mas manda um recado pro Seby: quando ele quiser minha ajuda ele que venha pessoalmente - riu de volta. - Mais alguma coisa?




-Não. Era só isso.




-Isso e o almoço, você vai almoçar com a gente, não vai? A Rachel vai preparar lasanha.


Sonya quase fez uma careta: sabia que a psicóloga era vegana. Mas disse:




-Lógico que fico, é bom que te coloco a par das fofocas. Você tem que conhecer o Edric.




-Esse é o menino que o Seby comprou? Ele é o que, namorado dele?




-Não sei - ela deu de ombros. - O coitadinho foi tão abusado durante a vida que acho que vai ter trabalho pra levar uma vida sexual/afetiva normal. 

Foi aí que surgiu Rachel, com uma toalha nos ombros:




-Quem foi abusado?




-Edric, filho do senador Brooke. O Seby comprou ele num leilão. 

A moça pareceu horrorizada, mas depois falou:




-Estou participando de um projeto de psicólogos e psiquiatras específico pra quem sofreu abuso sexual. Talvez isso ajude o garoto. Isso é, se o Sebastian não estiver pretendendo abusar dele também.




-Oh, não, o Seby é tão bonzinho. Ele ficou furioso quando soube.




-Ah, minha vida, você não conhece o Seby direito, ele não aceita maus tratos, já perdi as contas de quantos animais ele me obrigou a resgatar. - Sam revelou tranquilo.




-E por que ele comprou um garoto num leilão? - Rachel não acreditava.




-Por que ele precisava se aproximar no senador, conhecer a casa e coisa e tal, e, outra: antes ele do que um velho tarado, não? - Sonya dizia como se fosse a situação mais óbvia da terra.


A psicóloga estava revoltada:




-O Senador Brooke é nojento. Sabiam que ele se casou com a esposa quando esta tinha apenas 16 anos?




-Informação interessante, Sonya pensou. Tudo isso estaria no dossiê que pedira para o marido fazer, mas era bom entender o que se falava do político por aí.




-Fizemos campanha contra ele na última eleição. Não deu certo, como pode ver - suspirou. - Às vezes a gente se desilude dessa vida de militância.




-Quer dizer que todos os podres dele estão em algum lugar, pra todo o mundo ver?
Rachel pareceu pensar um pouco:




-Devo ter alguns panfletos ainda lá em casa.




-Rachel, você deveria conversar com o Seby, ele sabe de muita coisa. - Sonya já unia as pontas, seu irmão iria adorar destruir o mundo do senador.




-Mas vocês não vão matar o manolo? - Samuel estava meio perdido no bate papo das mulheres.




-Mano, assassinar é uma arte e nosso irmão é o Picasso, ainda mais quando ele pega raiva de um dos seus alvos, ele quer destruir a vida do senador e expor seus podres seria um bom começo.




-Ah, tá, não tá mais aqui quem falou. 

A psicóloga ficava espantada em todas as conversas com o namorado e sua família, eles falavam de morte com uma naturalidade assustadora. Nessas horas, tinha vontade de se levantar e ir para a casa e nunca mais ver Sam na vida. Mas ela sabia que ia acabar voltando, porque amava ele demais.




-Amor, nós vamos almoçar que horas, estou faminto.




-A lasanha está assando. Não deve demorar muito.



Na mesma hora, Sebastian estava voltando para casa quando seu celular tocou. Era um número desconhecido, mas ele resolveu atender:




-Alô?




-Ai, graças a Deus, Sebastian. É a Katlyn. Tou ligando do celular da minha amiga. Ela sabe de tudo.




-O que aconteceu? - estacionou o carro para dar atenção à menina.




-Você disse que ia me ajudar, então precisa fazer isso logo. Minha mãe vai fazer mais uma cirurgia semana que vem, no dia 20. E eu vou ficar sozinha com o meu pai. Pelo amor de Deus, me ajuda! 

O homem ficou agradavelmente surpreso. Ia conseguir que o senador ficasse sozinho em casa e, melhor ainda, sem fazer nada! Só tinha um problema, seria bem antes do que esperava.




-Querida, fique tranquila, vou te tirar de lá em pouco tempo, consegue sair sem ser vista da escola amanhã? - torcia para que Sonya tivesse conseguido.




-Vou tentar. Tenho aula de educação física às nove horas e consigo pular o muro da rua Alphonso Tiger. É um beco atrás da escola. Sabe onde é? 

Rapidamente, Sebastian checou o GPS do carro. Não seria difícil encontrar.




-Sei.Te encontro às nove e dez nessa rua, fica tranquila, tenta dormir na casa da sua amiga hoje.




-Meu pai não te disse que ele nunca me deixa ir na casa das minhas amigas? Ele faz isso pra proteger minha virgindade - a última palavra foi dita com um sarcasmo amargo, a voz infantil embargada.




-Tá, não tem problema, até amanhã




-Até amanhã - ela estava chorando.

Sebastian desligou e telefonou para a irmã.




-Alô, maninho?




-Sonya, diz que o Sam te conseguiu a maconha.




-Melhor, estou aqui com ele - Sam retirou o telefone de seu ouvido.




-Sebastian, quando precisar de minha ajuda venha e fale comigo, pare de se esconder atrás da Sonya.




-Eu não me escondo atrás da Sonya! 

Em seguida, o interlocutor mudou de novo. Era a irmã:




-Maninho, a Rachel disse que sabe de um tratamento ótimo pro Edric. Devia trazê-lo aqui. E, ah, vem falar comigo que eu te dou o pacotinho pra Katlyn.




-Ela está aí?




-Oi, Sebastian, quer falar comigo? - mais uma vez o interlocutor mudou.




-Coloquem essa porcaria no viva voz! - o rapaz irritou-se. - Rachel, está ouvindo?




-Sim, estou - havia recebido a bronca, mas achara engraçado.




-Você vai fazer alguma coisa agora, pois estava pensando em ir aí agora, com o Edric.




-Você diz atendê-lo? Eu normalmente não atendo em casa mas posso conversar um pouco com ele.




-Ótimo vou passar em casa e levá-lo.




-Estamos no aguardo.




-Seby, você almoçou com o Scoty? Que besteira minha, claro que sim, a Rachel fez uma lasanha para comermos, você ia adorar. - se sentia mal por isso, mas conhecia o paladar e a sinceridade do irmão, ele não comeria aquela lasanha por nada e geraria um conflito.




-Que pena, Sonya, bem vou desligar. Me esperem: não demoro. - desligou sorrindo. 

Em alguns minutos, Sebastian chegava em sua casa. Encontrou Edric e Marie terminando de almoçar - juntos.




-Oi Sebastian, já almoçou? - Edric o recebeu sorrindo, tentando quebrar o clima com a Marie.




-Não, vou comer enquanto você se arruma, vamos sair.




-Aonde vamos?




-À casa do Sam, eu explico no caminho, agora vai lá se arrumar.




-Estou indo! Esse Sam é seu irmão, não é?
Só acenou com a cabeça, e começou a comer o restante de macarrão que estava em cima do fogão.




-Senhor, quer que eu faça alguma coisa? - ainda estava um pouco constrangida por estar sentada à mesa com o Edric.




-Não, Marie, obrigado. - voltou a dar atenção a sua comida. 

Seby estava terminando de comer quando o outro rapaz surgiu na porta:




-Estou pronto e ansioso pra conhecer seu irmão - disse. 

Sebastian mediu o garoto de cima a baixo, mas rapidamente se obrigou a voltar a si. Saíram. Na casa do irmão, foram recebidos pela Rachel:




-Você é Edric? Oi.




-Sou.




-Edric, essa é a Rachel - Sebastian apresentou-os.




-Sebastian!!!! - Samuel gritou chegando a entrada e puxando-os para dentro. 

Todos entraram, acompanhando o efusivo dono da casa.




-Achei que você não ia mais aparecer aqui, maninho! Está chateado comigo? O que foi que eu lhe fiz?




-Não seja tão dramático.




-Isso é o mesmo que pedir que Sam não seja Sam - Rachel brincou. - Edric, querido, gostaria de ver uma coisa lá dentro?




-O quê?




-Meus terrários, eu trouxe alguns deles para cá.


O rapaz aceitou o convite, deixando Sam, Sonya e Sebastian a sós.




-Olha só isso, Seby. Um quilo de cocaína em pequenos pacotinhos. Essa menina vai ser expulsa do colégio em dois tempos.




-Só diz pra ela espalhar pros colegas que tá com a droga - frisou o irmão.




-Vou ter que adiantar meus planos, ele vai ficar sozinho dia vinte, vou te....




-Quê, dia vinte?! E tu acha que eu sou o quê, mágico? Como que eu vou conseguir sarin em uma semana?!




-Você ia conseguir para o final da semana, menos drama - era a vez da Sonya de situar o irmão.




-Ia? - o coitado estava perdido. - Eu te falei que é difícil de conseguir, mana!




-Por favor, Sam, senão vou perder essa chance.




-Não é assim que funciona, mano. Vamos combinar o seguinte: eu vou tentar conseguir o sarin. Tentar. Se eu não conseguir a tempo - e é provável que eu não consiga -, você dá outro jeito de matar ele. Sei lá, tiro na cabeça, mercúrio, cianeto, o que for.




-Mas mexa seu pauzinhos - Sonya já dizia impaciente.




-Já disse que vou fazer o possível!




-Tudo bem, qualquer coisa eu dou jeito.

Enquanto isso, Rachel tentava ganhar a confiança de Edric:

-Gosta de terrários?

-Acho… acho que sim. O que são terrários, mesmo?


-São aquários usados como vasos de suculentas. Olha esse. Eu plantei cinco tipos de suculentas.

-Legal.


-Você tem algum hobby?


-Não.


-Nem um? Você tem cara de quem gosta de quadrinhos. Gosta de quadrinhos?


-Gosto de videogame. - disse dando os ombros.


-Oh, videogame. E qual é o seu jogo preferido?


-Não sei, gosto de vários: Assassin’s Creed, Mortal Kombat, Resident Evil 4, NeverDead, Manhunt, pensando bem acho que, de todos, Manhunt é meu favorito.

A mulher sentiu um calafrio percorrer a espinha. Parece que esse menino veio parar na família certa. Sorriu amarelo:


-Você leva o hobby bem a sério, ou é só passatempo mesmo? Digo, tem vontade de fazer cosplay e outras coisas?


-Não sei, nunca fui de fazer muitas escolhas - deu os ombros novamente.


-Mas não tem vontade?


-Não sei se tenho vontade, acho que você não entenderia - sorriu triste, o que não passou despercebido pela psicóloga, que constatou que o caso era “um pouquinho” mais complicado que o descrito pela provável futura cunhada.


-E por que eu não entenderia?


-Você já foi abusada?

Ela se surpreendeu. Normalmente os pacientes não eram tão diretos com relação a essas coisas.


-Mas isso é horrível!


-Viu, não entende - desviou voltando-se para as plantas.

Ela ficou por alguns minutos em silêncio, deixando o menino pensar. Então disse carinhosamente:


-Querido, posso não entender, mas estudei muitos anos para tentar. Sou psicóloga. Deixe-me ajudá-lo.


-Eu não preciso de ajuda, você não pode me fazer esquecer de tudo que passei, não pode trazer meu pai de volta, então não pode fazer nada.


-Há muitos meios de reverter uma coisa ruim, Edric. Você pode começar de novo.


-Eu estou começando de novo, por algum motivo o Sebastian me deu uma nova chance e isso já é o suficiente.


-Venha, sente-se aqui - puxou-o para um divã. - Gostaria de lhe pedir uma chance.


-Uma chance?


-Sim, uma chance. Uma vida como a que você teve não se supera simplesmente pondo uma pedra por cima. Já atendi muitas pessoas com problemas parecidos, sabia? E todas elas precisavam recomeçar.


-Parecidos? Você não tem ideia do que passei nesses dez anos.

Ela suspirou. Achou melhor não insistir. No entanto, ainda tinha uma cartada.


-Ok, vou aceitar sua recusa, mas com uma condição.

-Diga.

A mulher se levantou, pegou um livro da estante e entregou ao rapaz:

-Leia esse livro. Fala um pouco sobre a terapia que venho desenvolvendo, e como os pacientes reagem a ela. Se, ainda assim não quiser tentar, eu não lhe importuno mais.


-Tudo bem, vou ler. - sorriu para a psicóloga.

Sebastian interrompeu o momento.

-Atrapalho?


-Não. - Edric respirou aliviado ao ver o mais velho.


-Que bom que apareceu, precisava mesmo falar com você.


-A Sonya disse. Edric você pode me esperar na sala?


-Posso - disse e saiu com o livro nas mãos.


-Sebastian, o que vai fazer com esse garoto quando se cansar dele?


-Me cansar? Do que você está falando?


-Você comprou ele em um leilão para se aproximar do senador. O que vai fazer quando conseguir tudo que quer? Ele não é um brinquedinho que você usa e joga num canto - o convívio com aquela família a fez ser mais direta.

Sebastian olhou para ela com o canto dos olhos, pensando. Essa pergunta já havia sido feita para ele, pelo seu pai, havia muitos dias. O que fazer com Edric depois de a missão ter sido cumprida? Depois de muito pensar, havia chegado a uma solução, que não o agradava mas que parecia ser a única possível:


-Devolvê-lo para a mãe. Ela acha que ele está estudando no exterior.

Rachel recebeu a notícia num misto de surpresa e alívio. Até que enfim alguém naquela bendita família demonstrava algum bom senso.


-Obrigada, Sebastian.


-Pelo o quê, não lhe fiz nada.

A psicóloga sorriu. Ele nem imaginava como aquilo lhe dava esperança de que Sam também mostrasse seu lado humanitário, de que havia luz no fim do túnel para aquele relacionamento estranho entre os dois.


-Mais alguma coisa, Rachel?


-Não, Sebastian.


-Aproveitando então, eu queria saber se você pode atender o Edric, ele é meio abalado


-Eu estava conversando com ele sobre isso agora. Pelo que Sonya me contou, ele foi abusado pelo próprio pai, não foi?


-Ele não é pai dele, é padrasto, não que isso mude muita coisa, mas pelo que ele me contou o pai morreu.

Rachel lembrou-se de que o garoto tinha falado algo a respeito do pai falecido.


-Eu conversei com ele. Ele está relutando em receber o tratamento, mas eu te peço que não insista com ele. Dei-lhe um livro para ler...


-Vou conversar com ele, pode deixar, mas já aviso que não sou o mais indicado.


-É justamente isso que estou dizendo. Não toque nesse assunto com ele, só se ele vier falar. Quero que ele decida por si mesmo. Ele pareceu não ter muita iniciativa, pelo que eu vi.


-Ele não tem mesmo, tive dificuldade com isso no inicio de nossa convivência e -ah- tenho uma pergunta.


-Diga.


-O Edric teve pesadelos ontem, e só conseguiu dormir quando foi ao meu quarto e deitou-se comigo.


-Ele se deitou com você?


-Sim, o que me preocupa é por que insônia gera uma séries de problemas físicos.

A mulher estava pensativa. O que aquilo podia significar? Normalmente pessoas que sofrem abusos têm muitas dificuldades de se entregar a um relacionamento, mesmo de amigos, e mais dificuldade ainda em manter contato físico íntimo, como dormir junto com outras pessoas.


-Há quanto tempo ele está na sua casa?


-Não lembro, parece que nos conhecemos há anos, mas não faz uma semana.


-Muito estranho…


-O que é estranho?


-Como um rapaz que sofreu do jeito que ele sofreu se entregou tão facilmente a um relacionamento? - Rachel examinava sua estante mental quase desesperada, procurando um livro que a ajudasse a explicar o que estava acontecendo.


-Que relacionamento? - Sebastian quase gargalhou. - Não existe relacionamento, ele confia em mim, só isso.


-Acredito - ela falou pacientemente - que confiança seja a base da maioria dos relacionamentos. Novamente, é muito estranho que ele confie em alguém tão rápido.


-Eu nunca fiz nada que ele não quisesse. E prometi que ninguém faria ele fazer algo que não quisesse. Talvez seja isso que tenha acontecido. 

Ela ainda não estava satisfeita. Faltava uma peça naquele quebra-cabeça.


-Sebastian, se o Edric resolver se consultar comigo, vou querer marcar uma sessão contigo para saber exatamente o que aconteceu nesses dias.


-Sim, tudo bem.


-E só mais uma coisa: não se apaixone por ele.

Sebastian quase engasgou.


-Desculpe, apaixonar?


-Muitas vezes acontece. A ideia da vítima é muito atrativa para muitos homens. Há uma mistura de pena e desejo de poder.


-Entendo, mas não me apaixonaria.


-Ele se sentiria traído se isso acontecesse - avisou a mulher.

O assassino percebeu que isso era verdade, e se lembrou das vezes em que tinha achado Edric atraente. E agora se achava um monstro, até pior que o senador.

Por sorte, Sam apareceu na porta logo em seguida. Ele trazia uma latinha de cerveja na mão e falava alto:


-Chega de papo cabeça, galera. Vamos beber!


-Não bebo cerveja, Sam, esqueceu?


-Não é pra você, Seby, é para minha linda aqui. - entregou a latinha para a noiva, que aceitou. - Quer uísque? Tem uísque aqui também, maninho.


-Conversaremos mais outra hora, Sebastian. Tem meu cartão?


-Não preciso, sei onde te encontrar.


-Ih, nem conta com aqui em casa, porque ela tá trabalhando demais.


-Exagerado - e beijou-lhe a boca.

Sebastian, porém, ficou com o aviso na cabeça e resolveu ir para casa, para pensar com calma. Edric não relutou, embora Sonya e Sam ficassem bem aborrecidos.


-Já?!


-Para com isso, Sonya, essa casa nem é sua - o caçula riu.

Acabaram indo embora, e a irmã também resolveu sair, pois deixara os pequenos com a babá, e estava ansiosa para ver se o marido terminara o dossiê sobre os alvos. À noite, Seby recebeu um e-mail com os dossiês em pdf. No corpo da mensagem, apenas três frases:

“Conteúdo baphonico. Detalhe para ‘deputado Jett tem porte de arma’. Te amo, maninho.”


Ele leu o conteúdo do email e não se surpreendeu, a maioria das informações já conhecia, e o resto imaginava. O Senador viera de uma família rica, estudara nas melhores universidades, e, ainda jovem, colecionava crimes de trânsito, como dirigir embriagado e sob efeito de drogas, ou acima do limite de velocidade. Durante sua vida, envolvera-se em três acidentes com morte, e, nos três, estava embriagado e a quase duzentos por hora. Em um deles, inclusive, fora constatado que ele estava sob o efeito de ecstasy. Isso nunca fora a público. Os policiais que anotaram esse efeito foram remanejados para uma cidadela no interior.


Sebastian continuou lendo. As festinhas do senador, em que se exploravam menores de idade, foram flagradas algumas vezes pela polícia, mas os casos nunca vieram a público nem foram alvos de investigação mais acurada. Um delegado que ousara levar isso à imprensa perdera seu cargo e fora processado por difamação. Ele foi encontrado morto dois anos depois, atropelado por um trator, pois mudara-se para o campo após a exoneração.


O rapaz já estava sentido ânsias de vômito. Passou os olhos pelo resto do documento, encontrando crimes de praxe, como doações para campanhas de fontes não identificadas, sonegação de impostos e a suspeita de que era o verdadeiro dono da TV Verdade, e seu irmão não passava de um laranja. Mas te todas as informações, as pessoais era as que mais lhe interessavam.


56 anos. Comprador costumaz de charutos cubanos e bebidas finas, sendo a sua preferida o uísque Glenfiddich 1937. Costuma vestir-se com apuro e tem um alfaiate particular, que o visita em casa para confeccionar seus ternos de linho e camisas de seda. Tem uma pequena coleção de relógios caríssimos, que troca conforme a ocasião.


Atualmente, é dono de três carros de luxo, um Mc Laren MP4 2012, Mercedes Bens SLR e um BMW X6. Em geral, troca de carro a cada ano. Gosta de música erudita e visita óperas sempre que possível. Nunca escondeu sua admiração por Giovanna Antonina, grande soprano que conheceu pessoalmente em uma de suas viagens à Itália.


Passou para o deputado, cujo dossiê leu com menos atenção, pois Sonya se responsabilizaria por ele. Além dos dados que já conhecia, como o envolvimento com lavagem de dinheiro da Igreja, Sebastian descobriu que o jovem Robert havia sido um delinquente juvenil de uma família de classe média baixa, usuário e pequeno traficante de drogas, pelo que fora preso havia 20 anos. Depois de 5 anos na cadeia, convertera-se à Igreja Amor em Cristo, e fora crescendo dentro da “corporação”. Ganhou prestígio e candidatou-se a deputado, e, ao ser eleito, “levara com ele” mais dois do mesmo partido. Levava uma vida luxuosa e gostava de jogar golfe.


Ficou mais um tempo observando dossiê quando foi interrompido pelo Edric:


-Ainda trabalhando? - Edric estava vestindo um calção e uma camiseta regata.

-Ainda, e você não deveria estar dormindo? - respondeu

O jovem olhou de relance os papeis que seu novo amigo segurava, e leu, rapidamente, "Irvin Brooke" no topo.

-O que… é isso? - perguntou tremendo. Só ouvir aquele nome lhe dava arrepios.

-Calma Edric.

-Por que você tem esses papeis, o que é isso? É sobre o senador Brooke, não é?




-s-s-s-s-s-s-s




Tcha-rãm! *musiquinha de suspense* Agora vocês vão ter que esperar mais uma semana pra saber o resto. mwhahahahaha

No próximo capítulo: Penúltimo capítulo! Seby conta tudo para o Edric! Como ele vai reagir?
Os dois vão experimentar a "terapia nova" da Rachel. Sebastian vai jantar na casa do senador - e puxar o saco dele, claro.

Não esqueçam de comentar! 

Ps: estamos planejando uma nova série (mas uma fanfic) com um casal bem incomum e muita putaria gratuita e desnecessária. Quem aí gostaria de ler?

Beijos, e até o próximo sábado!

Leiam aqui o capítulo 4:
capítulo quatro - verdades

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